HISTÓRIA
Tiradentes
Tiradentes
Joaquim José da
Silva Xavier, o Tiradentes (Fazenda do Pombal, batizado em 12 de
novembro de 1746 — Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792)
foi um dentista, tropeiro,minerador, comerciante, militar e ativista político que atuou no Brasil colonial (1530-1815), mais especificamente nas capitanias de Minas
Gerais e Rio de Janeiro. No Brasil, é
reconhecido como mártir da Inconfidência
Mineira, patrono cívico do Brasil, patrono também das Polícias Militares dos Estados e herói nacional.
O dia de sua
execução, 21 de abril, é feriado nacional. A cidade mineira de
Tiradentes, antiga Vila de São
José do Rio das Mortes, foi
renomeada em sua homenagem.
Nascido em uma
fazenda no distrito de Pombal, próximo ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo,
à época território disputado entre as vilas de São João del-Rei e São
José do Rio das Mortes, na Minas
Gerais.
Joaquim José da
Silva Xavier era filho do português Domingos
da Silva Xavier,proprietário rural, e da brasileira Maria Paula da Encarnação Xavier
(prima em segundo grau de Antônio
Joaquim Pereira de Magalhães), tendo sido o quarto dos nove filhos.
Em 1755, após o
falecimento de sua mãe, segue junto a seu pai e irmãos para a sede da Vila de
São Antônio; dois anos depois, já com onze anos, morre seu pai. Com a morte
prematura dos pais, logo sua família perde as propriedades por dívidas. Não fez
estudos regulares e ficou sob a tutela de um primo, que era cirurgião dentista.
Trabalhou como mascate e minerador, tornou-se sócio de uma botica de
assistência à pobreza na ponte do Rosário, em Vila
Rica, e se dedicou também às práticas farmacêuticas e ao exercício da profissão
de dentista, o que lhe valeu o apelido (alcunha) de Tiradentes.
Com os
conhecimentos que adquirira no trabalho de mineração, tornou-se técnico em
reconhecimento de terrenos e na exploração dos seus recursos. Começou a
trabalhar para o governo no reconhecimento e levantamento do sertão sudestino.
Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania
de Minas Gerais; em 1781 foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na
patrulha do "Caminho Novo", estrada que servia como rota de
escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto Rio de Janeiro. Foi a partir desse
período que Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam a
exploração do Brasil pela metrópole, o que ficava evidente quando se
confrontava o volume de riquezas tomadas pelos corruptos e a pobreza em que o
povo permanecia. Insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar,
tendo alcançando apenas o posto de alferes,
patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de marechal
da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria em 1787.
Na crônica "Memórias da Rua do
Ouvidor"-capítulo 7, o
médico e escritor carioca Joaquim
Manuel de Macedo relata que neste
mesmo ano de 1787, Tiradentes conhece e se apaixona por uma certa
"Perpétua Mineira", dona de uma "casa de pasto"
(restaurante) na rua do Ouvidor, no Rio
de Janeiro. Segundo a crônica, Perpétua foi vista pela última vez em 21 de
abril de 1792 nas proximidades da forca onde havia sido executado seu amante.
Após a licença
da cavalaria, Tiradentes morou por volta de um ano na cidade carioca, período
em que idealizou projetos de vulto, como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de
água no Rio de Janeiro; porém,
não obteve aprovação para a execução das obras. Esse desprezo fez com que
aumentasse seu desejo de liberdade para a colônia. De volta às Minas Gerais, começou a pregar em Vila Rica e arredores, a favor da independência
daquela província. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da
elite mineira, como Cláudio
Manuel da Costa, antigo secretário de governo, Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor da
comarca, e Inácio José de
Alvarenga Peixoto, minerador. O movimento ganhou reforço ideológico com a independência das colônias
estadunidenses e a formação dos Estados Unidos. Ressalta-se que, à
época, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra
eram oriundos das Minas Gerais, o que permitiu à elite regional acesso aos
ideais liberais que circulavam na Europa.
Além das
influências externas, fatores mundiais e religiosos contribuíram também para a
articulação da conspiração nas Minas
Gerais. Com a constante queda na receita institucional, devido ao declínio da
atividade da cana de açúcar, a reforma econômica a metrópole portuguesa de D.João V instituiu medidas que garantissem o Quinto, imposto que obrigava os
residentes das Minas Gerais a pagar, semestralmente, cem arrobas de prata,
destinadas à Real Fazenda. A partir da nomeação de Antônio Oliveira Meneses como governador da província, em 1782,
ocorreu a marginalização de parte da elite local em detrimento de seu grupo de
amigos. O sentimento de revolta atingiu o máximo com a decretação da derrama, uma medida administrativa que
permitia a cobrança forçada de impostos , mesmo que preciso fosse prender o
cobrado, a ser executada pelo novo governador das Minas Gerais, Luís Antônio Furtado de Mendonça, 6.º
Visconde de Barbacena (futuro Conde
de Barbacena), o que afetou especialmente as elites mineiras. Isso se fez
necessário para se saldar a dívida mineira acumulada, desde 1762, do quinto,
que à altura somava 768 arrobas de ouro em impostos atrasados.
O movimento se
iniciaria na noite da insurreição: os líderes da "confidência"
sairiam às ruas de Vila Maria dando vivas à República, com o que ganhariam a
imediata adesão da população. Porém, antes que a conspiração se transformasse
em revolução, em 15 de março de 1789 foi delatada aos portugueses por Joaquim Silvério dos Reis, coronel, Basílio de Brito Malheiro do Lago, tenente-coronel, e Inácio Correia de Pamplona, luso-açoriano,
em troca do perdão de suas dívidas com a Real Fazenda. Anos depois, por ordem
do novo oficial de de milícia Ernesto
Gonçalves, planejou o assassinato de Joaquim
Silvério dos Reis.
Entrementes, em
14 de março, o Visconde de Barbacena já havia suspendido a derrama o que de esvaziara por completo o
movimento. Ao tomar conhecimento da conspiração, Barbacena enviou Silvério dos
Reis ao Rio para apresentar-se ao vice-rei, que imediatamente (em 7 de maio)
abriu uma investigação (devassa). Avisado, o alferes Tiradentes, que estava em viagem
licenciada ao Rio de Janeiro escondeu-se na casa de um amigo, mas foi
descoberto ao tentar fazer contato com Silvério dos Reis e foi preso em 10 de
maio. Dez dias depois o Visconde de Barbacena iniciava as prisões dos
inconfidentes em Minas.
Dentre os
inconfidentes, destacaram-se os padres Carlos
Correia de Toledo e Melo, José da
Silva e Oliveira Rolim e Manuel Rodrigues da Costa, o
tenente-coronel Francisco de Paula
Freire de Andrade, comandante dos Dragões,
os coronéis Domingos de Abreu
Vieira e Joaquim José dos Reis (um dos delatores do movimento), os
poetas Cláudio Manuel da Costa, Inácio José de Alvarenga Peixoto e Tomás
Antônio Gonzaga, ex-ouvidor.
Os principais
planos dos inconfidentes eram: estabelecer um governo republicano independente
de Portugal, criar industrias no
país que surgiria, uma universidade em Vila
Rica e fazer de São João del-Rei a capital. Seu primeiro presidente
seria, durante três anos, Tomás
António Gonzaga, após o qual haveria eleições. Nessa república não haveria exército – em vez disso, toda a população
deveria usar armas, e formar uma milícia quando necessária. Há que se ressaltar
que os inconfidentes visavam a autonomia somente da província das Minas Gerais,
e em seus planos não estava prevista o direito de autonomia da população
feminina.
Negando a princípio
sua participação, Tiradentes foi o único a, posteriormente, assumir toda a
responsabilidade pela "inconfidência", inocentando seus companheiros.
Presos, todos os inconfidentes aguardaram durante três anos pela
finalização do processo. Alguns foram condenados à morte e outros ao degredo;
algumas horas depois, por carta de clemência de D. Maria I, todas as sentenças foram
alteradas para degredo, à exceção
apenas para Tiradentes, que continuou condenado à pena capital, porém não por
morte cruel como previam as Ordenações do Reino: Tiradentes foi enforcado.
Os réus foram
sentenciados pelo crime de "lesa-majestade",
definida, pelasordenações afonsinas e
as Ordenações Filipinas, como traição contra o rei. Crime
este comparado à hanseníase pelas Ordenações Filipinas:
Lesa-majestade
quer dizer traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado, que é
tão grave e abominável crime, e que os antigos Sabedores tanto estranharam, que o
comparavam à lepra; porque assim como esta enfermidade enche todo o corpo, sem
nunca mais se poder curar, e empece ainda aos descendentes de quem a tem, e aos
que ele conversam, pelo que é apartado da comunicação da gente: assim o erro de
traição condena o que a comete, e empece e infama os que de sua linha
descendem, posto que não tenham culpa.”
Por igual crime de lesa-majestade, em 1759, no
reinado de D. José I de Portugal, a família Távora, no processo dos
Távora, havia padecido de morte cruel: tiveram os membros quebrados e foram
queimados vivos, mesmo sendo os nobres mais importantes de Portugal. A Rainha Dona
Maria I sofria pesadelos devido à cruel execução dos Távoras ordenado por
seu pai D. José I e terminou por enlouquecer.
Em parte por ter sido o único a assumir a
responsabilidade, em parte, provavelmente, por ser o inconfidente de posição
social mais baixa, haja vista que todos os outros ou eram mais ricos, ou
detinham patente militar superior. Por esse mesmo motivo é que se cogita que
Tiradentes seria um dos poucos inconfidentes que não era tido como maçom.
E assim, numa manhã de sábado, 21 de abril
de 1792, Tiradentes percorreu em procissão as ruas do centro da cidade do Rio
de Janeiro, no trajeto entre a cadeia pública e onde fora armado o patíbulo. O
governo geral tratou de transformar aquela numa demonstração de força da coroa
portuguesa, fazendo verdadeira encenação. A leitura da sentença estendeu-se por
dezoito horas, após a qual houve discursos de aclamação à rainha, e o cortejo
munido de verdadeira fanfarra e composta por toda a tropa local. Bóris
Fausto aponta essa como uma das possíveis causas para a preservação da
memória de Tiradentes, argumentando que todo esse espetáculo acabou por
despertar a ira da população que presenciou o evento, quando a intenção era, ao
contrário, intimidar a população para que não houvesse novas revoltas.
Executado e esquartejado, com seu sangue se
lavrou a certidão de que estava cumprida a sentença, tendo sido declarados
infames a sua memória e os seus descendentes. Sua cabeça foi erguida em um
poste em Vila Rica, tendo sido rapidamente cooptada e nunca mais localizada;
os demais restos mortais foram distribuídos ao longo do Caminho Novo: Santana
de Cebolas (atual Inconfidência, distrito de Paraíba do Sul), Varginha
do Lourenço, Barbacena e Queluz (antiga
Carijós, atual Conselheiro Lafaiete), lugares onde fizera seus discursos
revolucionários. Arrasaram a casa em que morava, jogando-se sal ao terreno para
que nada lá germinasse.
“JUSTIÇA que a Rainha Nossa Senhora manda fazer a este infame
Réu Joaquim José da Silva Xavier pelo horroroso crime de rebelião e alta
traição de que se constituiu chefe, e cabeça na Capitania de Minas Gerais, com
a mais escandalosa temeridade contra a Real Soberana e Suprema Autoridade da
mesma Senhora, que Deus guarde.
MANDA que com baraço e pregão seja levado pelas
ruas públicas desta Cidade ao lugar da forca e nela morra morte natural para
sempre e que separada a cabeça do corpo seja levada a Vila Rica, donde será
conservada em poste alto junto ao lugar da sua habitação, até que o tempo a
consuma; que seu corpo seja dividido em quartos e pregados em iguais postes
pela estrada de Minas nos lugares mais públicos, principalmente no da Varginha
e Sebollas; que a casa da sua habitação seja arrasada, e salgada e no meio de
suas ruínas levantado um padrão em que se conserve para a posteridade a memória
de tão abominável Réu, e delito e que ficando infame para seus filhos, e netos
lhe sejam confiscados seus bens para a Coroa e Câmara Real. Rio de Janeiro, 21
de abril de 1792, Eu, o desembargador Francisco Luiz Álvares da Rocha, Escrivão
da Comissão que o escrevi. Sebão. Xer. de Vaslos. Cout.
Tiradentes permaneceu, após a Independência
do Brasil, uma personalidade histórica relativamente obscura, dado o fato de
que o Brasil continuou sendo uma monarquia após a independência do Brasil, e,
durante o Império, os dois monarcas, D. Pedro I e D. Pedro
II, pertenciam à casa de Bragança, sendo, respectivamente, neto e bisneto
de D. Maria I, contra a qual Tiradentes conspirara, e, que havia emitido a
sentença de morte de Tiradentes e comutado as penas dos demais inconfidentes.
Durante a fase imperial do Brasil, Tiradentes também não era aceito pelo fato
de ele ser republicano. O "Código Criminal do Império do Brasil",
sancionado em 16 de dezembro de 1830, também previa penas graves para quem
conspirasse contra o imperador e contra a monarquia:
“Art. 87. Tentar diretamente, e por fatos,
destronizar o Imperador; privá-lo em todo, ou em parte da sua autoridade
constitucional; ou alterar a ordem legítima da sucessão. Penas de prisão com
trabalho por cinco a quinze anos. Se o crime se consumar: Penas de prisão
perpétua com trabalho no grau máximo; prisão com trabalho por vinte anos no
médio; e por dez anos no mínimo. —Código Criminal de 1830
Foi a República – ou, mais
precisamente, os ideólogos positivistas que presidiram sua fundação –
que buscaram na figura de Tiradentes uma personificação da identidade
republicana do Brasil, mitificando a sua biografia. Daí a sua iconografia
tradicional, de barba e camisolão, à beira do cadafalso, vagamente assemelhada
a Jesus Cristo e, obviamente, desprovida de verossimilhança. Como
militar, o máximo que Tiradentes poder-se-ia permitir era um discreto bigode.
Na prisão, onde passou os últimos três anos de sua vida, os detentos eram
obrigados a raspar barba e cabelo a fim de evitar piolhos. Também, o nome
do movimento, "Inconfidência Mineira", e de seus participantes, os
"inconfidentes", foi cunhado posteriormente, denotando o caráter
negativo da sublevação – inconfidente é aquele que trai a
confiança. Outra versão diz que por inconfidência era termo usado na legislação
portuguesa na época colonial e que "entendia-se por inconfidência a quebra
da fidelidade devida ao rei, envolvendo, principalmente, os crimes de traição e
conspiração contra a Coroa", e, que para julgar estes crimes eram criadas
"juntas de inconfidência".
Historiadores como Francisco de Assis Cintra e
o brasilianista Kenneth Maxwell procuram diminuir a importância de
Tiradentes, enquanto autores mineiros como Oilian José e Waldemar de Almeida
Barbosa procuram ressaltar sua importância histórica e seus feitos,
baseando-se, especialmente, em documentos sobre ele existente no Arquivo
Público Mineiro.
Atualmente, onde se encontrava sua prisão,
funcionou a Câmara dos Deputados na chamada "Cadeia Velha",
que foi demolida e no local foi erguido o Palácio Tiradentes que
funcionava como Câmara dos Deputados até a transferência da capital federal
para Brasília. No local onde foi enforcado ora se encontra a Praça
Tiradentes e onde sua cabeça foi exposta fundou-se outra Praça
Tiradentes. Em Ouro Preto, na antiga cadeia, hoje há o Museu da
Inconfidência. Tiradentes é considerado atualmente Patrono Cívico do Brasil,
sendo a data de sua morte, 21 de abril, feriado nacional. Seu nome consta
no Livro de Aço do Panteão da Pátria e da Liberdade, sendo considerado
Herói Nacional.
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