EDUCAÇÃO
Quem quer ser professor?
08
de maio de 2013 | 2h 05
O Estado de S.Paulo
O governo federal
alardeia que ser professor é exercer "a profissão que pode mudar o
País", mas o que se comprova é que se trata de uma carreira que vem
perdendo prestígio e pela qual há cada vez menos interessados.
O problema é
especialmente grave no ensino de ciências exatas, essencial para o crescimento
de qualquer país. Embora não se trate de algo novo, o fenômeno tem se acentuado
nos últimos tempos, e há novos levantamentos mensurando o grande desinteresse
dos jovens pelo desafio de ensinar e, dessa forma, "construir um Brasil
mais desenvolvido", como diz a propaganda oficial destinada a atrair mão
de obra para as salas de aula.
Uma pesquisa recente
feita com ingressantes nos cursos de licenciatura em matemática e física na
Universidade de São Paulo (USP) mostra que cerca de 50% deles não estão muito
dispostos a dar aula nas respectivas áreas. O resultado é particularmente
importante quando se leva em conta o fato óbvio de que os cursos de
licenciatura são justamente aqueles que formam professores para o ensino
fundamental e o médio.
A pesquisa constatou
que a maioria dos ingressantes nesses cursos de licenciatura optou por eles
porque a exigência do vestibular era bem menor, porque o curso é gratuito,
porque têm afinidade com matemática ou física e porque abrem caminho para a
pós-graduação. O levantamento mostra ainda que os ingressantes em licenciatura
se enquadram num perfil socioeconômico mais baixo do que o dos demais cursos na
USP, situação que, de acordo com o estudo, se repete em cursos semelhantes em
outras partes do Brasil. É, portanto, uma porta de acesso ao ensino superior
para as faixas mais pobres da população.
Os estudantes que se
disseram em dúvida sobre abraçar a carreira de professor destacaram que podem
se sentir estimulados se a escola for "reconhecida por ter um bom trabalho
educacional" ou se tiver "autonomia para elaborar projetos
educativos, ensinando com certa liberdade". As respostas denotam idealismo
dos entrevistados, mas, na prática, impõem condições que hoje não são atendidas
na rede pública de ensino, mas apenas nas escolas particulares.
O sistema educacional
público no Brasil padece de um erro de enfoque: privilegiam-se os controles de
desempenho dos professores - inclusive com a distribuição de prêmios em
dinheiro - sem, no entanto, valorizar a carreira em si. Os salários são
considerados baixos em vista da importância da profissão. Pretende-se exigir
dos professores que sejam conscientes de sua importância social, mas o magro
contracheque diz outra coisa.
Além disso, a
precariedade das instalações da maioria das escolas públicas evidencia o
descaso do Estado com os profissionais de educação, obrigados a lidar com a
crônica falta de material e de equipamentos para enfrentar o desafio diário de
estimular seus alunos a aprender.
Outro aspecto que foi
levantado pelos entrevistados na pesquisa diz respeito ao desprestígio da
profissão de professor na educação básica. Estudantes de medicina ouvidos pelos
pesquisadores disseram que não se tornariam professores porque, entre outros
motivos, a remuneração é baixa, a possibilidade de ascensão profissional é
mínima e as condições das escolas são ruins. No entanto, esse mesmo grupo de
entrevistados, assim como os demais, enfatizou que considera o professor muito
relevante para o País, por ser o responsável pela transmissão de valores e
conhecimentos.
Há, portanto, um
abismo entre o ideal de uma carreira e sua realidade, demonstrado cabalmente
pelo desinteresse dos estudantes de licenciatura. Assim, o déficit de
professores de matemática, física e química, que já é de 170 mil, tende a
crescer.
O resultado disso é
que o desempenho dos alunos da rede pública em ciências exatas, que já é um dos
mais fracos do mundo, tem tudo para piorar - a não ser que o governo aja
radicalmente e, sem mais delongas, restitua ao magistério o orgulho
profissional.
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