Educação
Inclusão: o valor da palavra
A terminologia para se referir às pessoas com deficiência foi mudando de acordo com o que se entendia sobre o tema. Saiba o que dizem os especialistas e navegue pela linha do tempo interativa.
Palavras como
"inválido", "defeituoso" e "incapaz" hoje soam
terrivelmente pejorativas e desrespeitosas aos nossos ouvidos quando nos
referimos a pessoas com deficiência. Antigamente, no entanto, elas compunham a
nomenclatura vigente e eram utilizadas de forma natural em conversas e textos,
como leis e matérias de jornal. Ao longo dos anos, esses termos foram sendo
substituídos por outros, chegando a "pessoas com deficiência" -
atualmente adotado por órgãos oficiais e recomendado por especialistas.
Longe de caminhar
sozinha pelo tempo e ser escolhida ao gosto do falante, a nomenclatura de
inclusão -- aquela usada para se referir a pessoas com qualquer tipo de
necessidade especial -- acompanha a evolução do que se entende por deficiência.
E, portanto, cada mudança de terminologia agrega um valor diferente à palavra.
"Essa nomenclatura e seu valor refletem a cultura do momento. Nem sempre a
mudança é para melhor e ela pode até significar uma regressão", explica
Romeu Kazumi Sassaki, consultor de inclusão há mais de 50 anos e autor de
diversos artigos sobre o tema.
Para os
especialistas no assunto, a discussão sobre terminologia é muito importante,
porque mostra os avanços na forma como as pessoas com deficiência são vistas
pela sociedade da qual fazem parte. "Quando você muda o modo de falar
sobre alguém, de nomear alguém, você também muda o comportamento em relação
àquela pessoa", explica a professora Rossana Ramos, doutora em linguística
e autora do livro Inclusão
na Prática: Estratégias Eficazes para a Educação Inclusiva (Ed. Summus, 128 págs.).
"Politicamente correto"
não deve motivar mudança
Ainda que a mudança de
terminologia vise deixar claro o conceito de deficiência e fugir do
preconceito, algumas pessoas ainda confundem a transformação com o politicamente
correto. A jornalista Cláudia Werneck, autora de 14 livros sobre inclusão e
superintendente da Escola de Gente, organização que promove projetos de
comunicação inclusiva, é enfática sobre isso. "Eu sou contra o
politicamente correto. Eu trabalho com o inclusivamente correto", diz.
Essa confusão pode levar a criação de eufemismos, bons exemplos da má
compreensão do conceito. "A pessoa entende [a deficiência] quase como um
castigo, mas não quer que ninguém saiba disso e começa a criar metáforas",
explica. Um dos exemplos é o termo "pessoa especial". "Em termos
de política pública de Estado democrático, toda pessoa é uma pessoa de direito
e não um ser especial. É preciso entender que as pessoas com deficiência têm
necessidades específicas inerentes à deficiência", explica Cláudia.
O consultor
Romeu Sassaki entende que os eufemismos podem nascer com uma boa intenção,
procurando diminuir o impacto da palavra deficiência, mas, no fundo, terminam
sendo uma camuflagem para a realidade. Além disso, eles não são exclusivos para
as pessoas com deficiência. "Os eufemismos não conseguem atingir o
objetivo de dar um nome correto àquele grupo, não o caracteriza em relação aos
demais grupos", diz o consultor.
A hora certa de usar
Depois de se
familiarizar com a terminologia mais aceita, é preciso também saber quando
usá-la para não cair na rotulação. "Quando você coloca a deficiência na
frente da pessoa, você a está rotulando", diz Daniela Alonso,
psicopedagoga e selecionadora do Prêmio Victor Civita Educador Nota 10. Frases
como "cego ganha na loteria" em uma notícia seria um exemplo, já que
o fato de a pessoa ter deficiência visual não é o mais importante para o texto.
Por isso, é necessário contextualizar sobre o que se está falando para dizer
que alguém é uma pessoa com deficiência.
Após toda essa
discussão, é importante lembrar que a nomenclatura de inclusão é mutável e a
escolha desta ou daquela palavra traz consigo um valor. Evitar termos já
superados ajuda a não propagar preconceitos, ainda que por desconhecimento.
"A linha do tempo mostra as mudanças que ocorreram e não necessariamente
que a sociedade aprendeu a não usar os que foram superados", diz Sassaki.
Raissa Pascoal
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