LEITURA
EM RISTE
A orfandade
mexe com a gente. Azeda, desanda. É o leite deixado ao sol do meio-dia e que
coalha irremediável.
Eu já fui melhor do que isto. Me transgredi no que sou
e no que fui. Me tornei algo de mim que esteve lá no final e que estava desde o
começo; como um casulo prestes a eclodir.
Eu me eclodo enquanto morro nas lágrimas ou vivo
diante dos temores e horrores que me dizem.
Aliás, pouco se diz com palavras. Me arranham a imagem
com gestos medíocres que só os banais acham bonito. Eles enxergam beleza onde
há fealdade. E aí eu me lembro de um autor lido, enquanto eu era novo.
Eu mudo meu gênero para parecer mais "importante",
numa sociedade de feminicidas. Nossa honra não é nada. É poeira. A palavra é
rasgada. O dedo em riste é piada pra "inglês ver". Eu não choro...
Não perco meu tempo com isto.
A flor vermelha despetala-se na mesa de vidro e eu
vejo seu reflexo como o sangue que se esvai das minhas feridas.
Eu não tenho mais tempo. Talvez eu morra quando
desperte. Ou desperte já morto. E, eu em frangalhos... enquanto ainda sobram os
canalhas. Mas eu hei de rir e me regozijar com a vitória da nobreza de atitudes
e a derrocada da fertilidade de mentes vãs. E vãos cidadãos que se matam com
seus próprios rifles. E dedos em riste.