VIRTUDES
HUMANO EM SER
As
segundas-feiras parecem ter uma sobriedade encrustada, aquela nostalgia do fim
de semana que já passou. Não quero que elas sejam todas iguais, embora nunca
sejam mesmo. Cada momento é único na vida da gente.
Pensei
em tomar café na outra padaria, ver pessoas diferentes das que eu vejo todos os
dias no mesmo horário. Ter novas histórias.
O Bahia me atendeu como se eu lá fosse
todo dia. Botou o café com leite na xícara branca, como fez desde a primeira
vez que me viu. Ele nunca me serviu no copo americano e, por mais que eu não
tenha perguntado neste tempo todo, sei que ele me faz distinção. Num dia,
quando uma outra moça me atendeu, ele chegou e disse: "Olha só, ela colocou
para você neste copo! Viu como eu sei tratar bem os meus clientes?".
É, eu sei que sabe.
A nova colega do Bahia, jovenzinha, é
desastrada. Quebrou copo, quase caiu. O Bahia foi lá, ajudou. E a menina disse:
"Ele me liga para eu não perder a hora".
Pensei: ué, vai ver que é parente. Num
mundo em que as pessoas mal conversam entre si – talvez mais entre celulares –
e os colegas de trabalho querem mais é que todo mundo se exploda, seria
possível benesses deste tipo?
Sim,
seria.
O
Bahia liga para a menina sem interesse nenhum – destes que a gente possa
imaginar. "Eu me preocupo com quem paga aluguel, que nem eu. Só quero
ajudar".
Sem folga há um ano e sete meses, o
Bahia levanta todo dia às 4h. Mora no Itaim Paulista e vem com os patrões para
a padaria de Guarulhos, onde trabalha há três anos. É funcionário exemplar.
Nunca faltou. Chega no horário. E gasta seus créditos ligando para despertar a
menina que mora a cinco minutos da padaria.
Ele
faz de bom coração, de bom grado que falta a muita gente e, às vezes, em nós
mesmos. O Bahia tem disposição. Não reclama. Não ganha muito, mas faz o
bastante com o que tem: é ser humano. É humano em ser. Não tem esta mesquinhez
de querer puxar o tapete de ninguém ou de querer ser o melhor. É apenas ele
mesmo na grandeza da hombridade que hoje não se vê tanto por aí.
O Bahia bota o café na xícara. Serve
amor. Não tem tempo ruim, não tem dor de cabeça. Não tem segunda feia. Porque
há boniteza em viver.
Um
dia de cada vez.
Um
café de cada vez.
Humano
em ser.
Divinal.