Educação
Avaliação
Formativa e Psicologia Cognitiva: Correntes e Tendências
Gérard Scallon
Introdução Existem aquelas disciplinas, aqueles temas de
estudo que dão todas as aparências de um corpo de conhecimentos relativamente
estáveis. Por exemplo, e sem querermos ofender ninguém nem menosprezar o
esforço de certos colegas, os ensinamentos relativos às características e às
aplicações da curva normal das probabilidades não têm mudado muito nos últimos
anos; nem, aliás, o ensino dos algoritmos de resolução de equações do primeiro
grau com duas incógnitas! Não se pode dizer o mesmo da genética, da tecnologia
informática e da avaliação formativa das aprendizagens! Ao longo das últimas
duas décadas, a avaliação formativa tem sido o objeto de várias obras e, apesar
de tudo, ela se inscreve ainda hoje nos passos de uma intensa reflexão que
jamais deixou de dominar a teoria e a prática. Após os necessários
esclarecimentos sobre a sua natureza e os múltiplos aspectos de sua função de
regulação, talvez tenha havido o sentimento de um merecido descanso e de
assentamento das estruturas. Mas "pedra que rola não cria limo", e a
prática da avaliação formativa, na qual foi possível implantá-la com muitos
procedimentos de sedução, sempre é um empreendimento em andamento. O advento
das ciências ditas cognitivas e das pedagogias que nelas se inspiram está reavivando
um campo ainda em ebulição. O autor do presente texto vem se interessando há
vários anos pela metodologia da avaliação e, na hora em que entrevê as
perspectivas que se abrem a esse tipo de avaliação, achou por bem tomar uma
certa distância para melhor entrever o horizonte. As correntes e as tendências
que se prenunciam indicam que, mais cedo ou mais tarde, será necessário
trabalhar, pois os imperativos de certas pedagogias já estão adiantados para
com as práticas de avaliação implementadas.
A
herança dos pioneiros
Os primeiros exemplos que nos foram dados como fonte de inspiração para a metodologia da avaliação formativa inscrevem-se numa pedagogia por objetivos marcada por uma concepção da educação chamada "pedagogia do sucesso" (ou a pedagogia do domínio, tradução literal de mastery learning dos escritos anglo-saxãos). Bloom, Hastings e Madaus (1971, 1981) foram talvez aqueles que deram o primeiro pontapé ao propor um exemplo de questionário escrito seguido por um gabarito constituídos por variadas anotações ou por um manual de base. A utilização desse gabarito pelos alunos serviria de correção pedagógica, o que confere um caráter formativo ao instrumento utilizado (Bloom et al., 1971, p. 129ss).
Seria difícil apresentar todas as abordagens metodológicas que se sucederam. Os dispositivos de ensino que serviram para tornar operacional a pedagogia do sucesso, para acomodar seja o ensino coletivo (por exemplo, Block e Anderson, 1975), seja o ensino individualizado (por exemplo, Keller, 1968), têm-se prestado a uma metodologia da avaliação formativa que apresenta caracteres constantes: um conteúdo dividido em módulos, uma progressão marcada por objetivos intermediários e objetivos finais e testes ditos formativos (na maioria do tipo papel e lápis). A avaliação de interpretação criterial, dedicada mais ou menos explicitamente à certificação das competências em avaliação somativa (a qual nem sempre é evidente nos escritos de origem), tem sido rapidamente recuperada pelos defensores da pedagogia do sucesso para tornar-se o elemento-chave da metodologia da avaliação formativa. A sequência aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo tornou-se o marco conceitual mais divulgado para alimentar o discurso sobre a avaliação formativa, seja para redigir guias de avaliação, seja para formular políticas de avaliação. Segundo esse modelo de abordagem, os três elementos apresentam-se como etapas distintas e, do ponto de vista da formação dos profissionais da educação, a avaliação formativa é em si um objeto de estudo que se diferencia da didática e da pedagogia, o que não é necessariamente a única maneira de ver a questão, conforme atestam trabalhos recentes (por exemplo, Bain, 1988; Allal, 1979, 1988; Scallon, 1992). A noção de "remediação" não é, entretanto, uma noção abusada e pode apresentar-se como um meio apropriado de regulação de acordo com certas teorias de aprendizagem, conforme atesta uma obra recente de Fisher (1993, p. 22ss). Na sequência deste texto, a remediação como tal não é questionada. Tratar-se-á antes de reexaminar o caráter disjunto das três fases da sequência "aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo", tal como sugerido nos trabalhos tradicionais sobre a avaliação.
Os primeiros exemplos que nos foram dados como fonte de inspiração para a metodologia da avaliação formativa inscrevem-se numa pedagogia por objetivos marcada por uma concepção da educação chamada "pedagogia do sucesso" (ou a pedagogia do domínio, tradução literal de mastery learning dos escritos anglo-saxãos). Bloom, Hastings e Madaus (1971, 1981) foram talvez aqueles que deram o primeiro pontapé ao propor um exemplo de questionário escrito seguido por um gabarito constituídos por variadas anotações ou por um manual de base. A utilização desse gabarito pelos alunos serviria de correção pedagógica, o que confere um caráter formativo ao instrumento utilizado (Bloom et al., 1971, p. 129ss).
Seria difícil apresentar todas as abordagens metodológicas que se sucederam. Os dispositivos de ensino que serviram para tornar operacional a pedagogia do sucesso, para acomodar seja o ensino coletivo (por exemplo, Block e Anderson, 1975), seja o ensino individualizado (por exemplo, Keller, 1968), têm-se prestado a uma metodologia da avaliação formativa que apresenta caracteres constantes: um conteúdo dividido em módulos, uma progressão marcada por objetivos intermediários e objetivos finais e testes ditos formativos (na maioria do tipo papel e lápis). A avaliação de interpretação criterial, dedicada mais ou menos explicitamente à certificação das competências em avaliação somativa (a qual nem sempre é evidente nos escritos de origem), tem sido rapidamente recuperada pelos defensores da pedagogia do sucesso para tornar-se o elemento-chave da metodologia da avaliação formativa. A sequência aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo tornou-se o marco conceitual mais divulgado para alimentar o discurso sobre a avaliação formativa, seja para redigir guias de avaliação, seja para formular políticas de avaliação. Segundo esse modelo de abordagem, os três elementos apresentam-se como etapas distintas e, do ponto de vista da formação dos profissionais da educação, a avaliação formativa é em si um objeto de estudo que se diferencia da didática e da pedagogia, o que não é necessariamente a única maneira de ver a questão, conforme atestam trabalhos recentes (por exemplo, Bain, 1988; Allal, 1979, 1988; Scallon, 1992). A noção de "remediação" não é, entretanto, uma noção abusada e pode apresentar-se como um meio apropriado de regulação de acordo com certas teorias de aprendizagem, conforme atesta uma obra recente de Fisher (1993, p. 22ss). Na sequência deste texto, a remediação como tal não é questionada. Tratar-se-á antes de reexaminar o caráter disjunto das três fases da sequência "aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo", tal como sugerido nos trabalhos tradicionais sobre a avaliação.
Quando a necessidade é mãe da
invenção
O que ocorre se a situação pedagógica não oferece aos alunos um itinerário marcado por objetivos ou por faixas de conteúdo? Ou, ainda, o que ocorre quando o percurso não está mais escalonado desde os objetivos mais baixos de uma hierarquia até os objetivos finais? É esse, no entanto, o tipo de pergunta que deve ser feito ante as pedagogias ditas de situação ou de projetos ou, ainda, em contextos de aprendizagem por problemas. Os programas revisados de francês, língua materna para as escolas do ensino fundamental do Quebec (Ministério da Educação do Quebec, 1979), novas abordagens da didática da leitura nessa etapa (Tremblay e Demers, 1990) e, por último, a aprendizagem por problemas que várias faculdades de medicina, entre as quais as do Quebec, têm adotado e estão em via de implementar (Berkson, 1990) são exemplos muito concretos. Pode-se entender que, nesses diversos casos, o ponto de entrada de qualquer processo de aprendizagem seja uma tarefa complexa de realizar ou um problema a resolver, isto é, uma tarefa que corresponde a um elemento muito mais próximo ao objetivo final do que a um objetivo de partida numa longa sequência de aprendizagens intermediárias. A sequência "aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo" não é mais apropriada para responder às questões levantadas no marco de pedagogia consideradas atuais.
Em primeiro lugar, a aprendizagem não está submetida às regras da pedagogia de domínio que ditam que todo elemento deve ser dominado antes de se abordar outro. Nessa ordem de ideias, é difícil conceber um ensino corretivo que tenha por principal meta o controle rigoroso de uma progressão. O que dizer então da avaliação formativa propriamente dita? A incerteza não é tão evidente quanto se poderia pensar, pois sempre existe a possibilidade de observar, de medir ou, ainda, de avaliar um desempenho. O imbróglio se apresenta com nitidez quando se trata de conceber ou visualizar a encenação. Quem avalia na pedagogia atual? A resposta é dada imediatamente, imaginando-se um episódio de objetivação da prática de comunicação pelo aluno no quadro de programas de francês renovados no Quebec. A resposta vem naturalmente também quando, numa situação de aprendizagem por problemas (como em medicina), os estudantes devem tomar um caso clínico e determinar suas necessidades de informações e seus objetivos de aprendizagem antes de seguir adiante. A participação, até o engajamento pessoal dos alunos, amplia-se e amplia a distância que se estabeleceu entre o modelo de avaliação formativa inicial e uma prática de avaliação que deve responder a imperativos de uma ordem totalmente diferente dos da pedagogia de domínio. É importante fazer constar que a participação dos alunos em sua própria avaliação formativa não se deve a exigências de ordem meramente prática, tais como, por exemplo, aliviar o fardo frequentemente representado pela avaliação num grupo de alunos para com desempenhos complexos. Tal particularidade deve-se muito mais a uma importante mudança no nível do próprio objeto da avaliação formativa, um material novo encontrado no campo das ciências cognitivas. Terei oportunidades para voltar a essa questão com mais detalhes.
Em suma, o discurso dos últimos anos sobre a avaliação formativa e as preocupações dos profissionais da educação têm permitido revelar que o modelo inicial de três fases, ou seja, "aprendizagem-avaliação-correção", podia dificilmente ser generalizado a contextos educativos outros que não os que serviram de fundamentação à pedagogia do sucesso.
O que ocorre se a situação pedagógica não oferece aos alunos um itinerário marcado por objetivos ou por faixas de conteúdo? Ou, ainda, o que ocorre quando o percurso não está mais escalonado desde os objetivos mais baixos de uma hierarquia até os objetivos finais? É esse, no entanto, o tipo de pergunta que deve ser feito ante as pedagogias ditas de situação ou de projetos ou, ainda, em contextos de aprendizagem por problemas. Os programas revisados de francês, língua materna para as escolas do ensino fundamental do Quebec (Ministério da Educação do Quebec, 1979), novas abordagens da didática da leitura nessa etapa (Tremblay e Demers, 1990) e, por último, a aprendizagem por problemas que várias faculdades de medicina, entre as quais as do Quebec, têm adotado e estão em via de implementar (Berkson, 1990) são exemplos muito concretos. Pode-se entender que, nesses diversos casos, o ponto de entrada de qualquer processo de aprendizagem seja uma tarefa complexa de realizar ou um problema a resolver, isto é, uma tarefa que corresponde a um elemento muito mais próximo ao objetivo final do que a um objetivo de partida numa longa sequência de aprendizagens intermediárias. A sequência "aprendizagem, avaliação formativa, ensino corretivo" não é mais apropriada para responder às questões levantadas no marco de pedagogia consideradas atuais.
Em primeiro lugar, a aprendizagem não está submetida às regras da pedagogia de domínio que ditam que todo elemento deve ser dominado antes de se abordar outro. Nessa ordem de ideias, é difícil conceber um ensino corretivo que tenha por principal meta o controle rigoroso de uma progressão. O que dizer então da avaliação formativa propriamente dita? A incerteza não é tão evidente quanto se poderia pensar, pois sempre existe a possibilidade de observar, de medir ou, ainda, de avaliar um desempenho. O imbróglio se apresenta com nitidez quando se trata de conceber ou visualizar a encenação. Quem avalia na pedagogia atual? A resposta é dada imediatamente, imaginando-se um episódio de objetivação da prática de comunicação pelo aluno no quadro de programas de francês renovados no Quebec. A resposta vem naturalmente também quando, numa situação de aprendizagem por problemas (como em medicina), os estudantes devem tomar um caso clínico e determinar suas necessidades de informações e seus objetivos de aprendizagem antes de seguir adiante. A participação, até o engajamento pessoal dos alunos, amplia-se e amplia a distância que se estabeleceu entre o modelo de avaliação formativa inicial e uma prática de avaliação que deve responder a imperativos de uma ordem totalmente diferente dos da pedagogia de domínio. É importante fazer constar que a participação dos alunos em sua própria avaliação formativa não se deve a exigências de ordem meramente prática, tais como, por exemplo, aliviar o fardo frequentemente representado pela avaliação num grupo de alunos para com desempenhos complexos. Tal particularidade deve-se muito mais a uma importante mudança no nível do próprio objeto da avaliação formativa, um material novo encontrado no campo das ciências cognitivas. Terei oportunidades para voltar a essa questão com mais detalhes.
Em suma, o discurso dos últimos anos sobre a avaliação formativa e as preocupações dos profissionais da educação têm permitido revelar que o modelo inicial de três fases, ou seja, "aprendizagem-avaliação-correção", podia dificilmente ser generalizado a contextos educativos outros que não os que serviram de fundamentação à pedagogia do sucesso.
Rumo a uma liberação da avaliação
formativa
A pedagogia do sucesso tem exercido uma sedução tal que quase se acreditou durante um certo tempo na existência de um elo inseparável entre esse tipo de pedagogia e a avaliação formativa das aprendizagens. Quanto a quebrar esse elo, Allal (1978) foi, em certo sentido, uma pioneira ao estabelecer a relação possível de existir entre a metodologia da avaliação formativa e as concepções psicológicas ou psicopedagógicas da aprendizagem. A sequência de partida já não aparece mais como sendo o único modo para integrar a avaliação formativa às práticas pedagógicas, pois processos não instrumentados, de natureza interativa quanto aos procedimentos de regulação, podem tornar-se parte de diversos contextos pedagógicos. Allal deu o nome de regulação interativa a esse processo de orientação contínua da situação de ensino e de aprendizagem para ajustá-lo melhor às características pessoais dos alunos (1979, p. 135-138).
Os princípios que tratam da avaliação formaram também um outro enclave para a avaliação formativa. Scallon (1992) procurou demostrar que, durante um certo tempo, a metodologia da avaliação formativa tem sido o objeto de um discurso com preocupações de natureza puramente docimológica, tais como a procura do número mínimo de questões a serem dadas num exercício e a determinação do patamar de sucesso ideal: isso para separar com a maior certeza possível os "alunos que dominam" dos que "não dominam"! Aliás, são muito poucos os procedimentos de determinação desse indicador de domínio no qual é aplicado, que usam como critério a eficácia do corretivo prescrito à luz dos alunos que o receberam. Porém, há mais do que isso! Costuma-se reconhecer que, num exame, num controle ou num exercício de verificação, o retrato do aluno não deve ser modificado ou alterado. O princípio está firmemente inscrito nas práticas de avaliação e refere-se, sem dúvida alguma, a preocupações que devem caracterizar qualquer operação de avaliação. Para medir temperatura, por exemplo, deve-se evitar que o calor de um termômetro altere a temperatura de um líquido. Isso para a preocupação de ordem docimológica quando o retrato a ser preservado é uma competência, uma habilidade ou um repertório de conhecimentos.
A noção de retroação (retroalimentação ou feedback) pode substituir-se a essa preocupação. Dessa ordem são os processos de verificação que propõem aos alunos as respostas corretas ou as soluções para verificar seu desempenho. Os instrumentos concebidos para serem utilizados pelos próprios alunos de maneira a que fiquem no melhor lugar da retroação inscrevem-se claramente nessa perspectiva. As tarefas de "realce" que os alunos devem efetuar em certos exercícios de francês antes de fornecer uma resposta-produto (como, por exemplo, concordar verbos com seus sujeitos) são da mesma ordem também (Tremblay e Demers, 1988, 1990). Pode-se entender, então, que a retroação, integrada ao conjunto de tarefas ou a problemas que o sujeito deve efetuar ou resolver, possa alterar da melhor maneira possível o retrato do aluno durante o próprio desenrolar do processo de observação ou de coleta de informação. Esse modo de ver contrasta com a perspectiva docimológica e revela antes preocupações de natureza didática ou pedagógica (Scallon, 1992). E, quanto a submeter a avaliação formativa a controles de qualidade, as pesquisas realizadas no quadro de várias aplicações de retroação têm permitido apoiar essa prática de avaliação em bases muito mais racionais do que empíricas. Podemos acrescentar que, quando a retroação é dada como destinação dos atos de avaliação formativa, estes se veem, de certa maneira, livres do domínio do ensino corretivo, conforme atestam certos trabalhos sobre a questão (por exemplo, Yeany e Miller, 1983; Provencher, 1985).
Não há dúvida de que as concepções cognitivas da aprendizagem têm criado, estão criando e, provavelmente, criarão grandes desafios à prática da avaliação formativa. Até agora, tudo parece ter acontecido em torno dos roteiros ou das encenações quanto ao papel dos atores engajados numa situação de ensino e aprendizagem. Tampouco há dúvida de que o aluno exerce um papel primordial − e isso não pode ser questionado. O que ocorre quanto à estrutura do que deve ser observado? Por exemplo, o produto de um processo ou o próprio processo associado a esse procedimento? E enquanto o "quê" da avaliação formativa é relativamente fácil de determinar, determinar o "como" é muito menos fácil. É preciso reconhecer que o discurso cognitivista, apesar da forte sedução que tem exercido e continua exercendo nos meios educacionais, tem-se mantido bastante impermeável aos imperativos da avaliação formativa, a qual deve ter como ponto de partida um processo de observação. Não são muitas as definições operacionais, e jamais podemos perder de vista que qualquer observação, qualquer medição até (antes de se chegar à avaliação) deve alimentar-se de indicadores de superfície. Por exemplo, a pontualidade não é visível como tal, mas as condutas que induz nos indivíduos o são. Como outro exemplo, não se pode apreender diretamente o estado de ansiedade de um indivíduo. No máximo, podem-se enumerar comportamentos indicadores de ansiedade. Essa limitação inerente de qualquer medição − e, consequentemente, de todo processo de avaliação − representa muito provavelmente um último enclave do qual a avaliação formativa dificilmente pode ser libertada.
Vê-se, portanto, que tudo está em seu lugar para uma liberação da avaliação formativa dos principais elementos que lhe foram associados inicialmente. Pode estar ao serviço de pedagogias outras que não a pedagogia de domínio, sem por isso renegar qualquer veleidade de dar a cada aluno as melhores chances de sucesso. A prática da avaliação formativa deve orientar-se também para preocupações muito mais didáticas do que docimológicas. Enfim, falta desenvolver estratégias de coleta de observações que permitam delinear processos, caminhos tomados por alunos, a partir de indicadores "de superfície", os quais deverão ser tratados de maneira particular (ver o texto de Jean Retschitzki na presente obra e também o de Scallon [1998b], que contém um capítulo sobre a observação dos erros sistemáticos em avaliação formativa). Parece cada vez mais evidente que essa liberação corresponde estreitamente a uma preocupação dominante: a de proporcionar a cada aluno (e também aos professores) uma retroalimentação de qualidade. Resta demostrar que o recente desenvolvimento das ciências cognitivas está reforçando essa preocupação e abrindo horizontes totalmente novos para a prática da avaliação formativa.
A pedagogia do sucesso tem exercido uma sedução tal que quase se acreditou durante um certo tempo na existência de um elo inseparável entre esse tipo de pedagogia e a avaliação formativa das aprendizagens. Quanto a quebrar esse elo, Allal (1978) foi, em certo sentido, uma pioneira ao estabelecer a relação possível de existir entre a metodologia da avaliação formativa e as concepções psicológicas ou psicopedagógicas da aprendizagem. A sequência de partida já não aparece mais como sendo o único modo para integrar a avaliação formativa às práticas pedagógicas, pois processos não instrumentados, de natureza interativa quanto aos procedimentos de regulação, podem tornar-se parte de diversos contextos pedagógicos. Allal deu o nome de regulação interativa a esse processo de orientação contínua da situação de ensino e de aprendizagem para ajustá-lo melhor às características pessoais dos alunos (1979, p. 135-138).
Os princípios que tratam da avaliação formaram também um outro enclave para a avaliação formativa. Scallon (1992) procurou demostrar que, durante um certo tempo, a metodologia da avaliação formativa tem sido o objeto de um discurso com preocupações de natureza puramente docimológica, tais como a procura do número mínimo de questões a serem dadas num exercício e a determinação do patamar de sucesso ideal: isso para separar com a maior certeza possível os "alunos que dominam" dos que "não dominam"! Aliás, são muito poucos os procedimentos de determinação desse indicador de domínio no qual é aplicado, que usam como critério a eficácia do corretivo prescrito à luz dos alunos que o receberam. Porém, há mais do que isso! Costuma-se reconhecer que, num exame, num controle ou num exercício de verificação, o retrato do aluno não deve ser modificado ou alterado. O princípio está firmemente inscrito nas práticas de avaliação e refere-se, sem dúvida alguma, a preocupações que devem caracterizar qualquer operação de avaliação. Para medir temperatura, por exemplo, deve-se evitar que o calor de um termômetro altere a temperatura de um líquido. Isso para a preocupação de ordem docimológica quando o retrato a ser preservado é uma competência, uma habilidade ou um repertório de conhecimentos.
A noção de retroação (retroalimentação ou feedback) pode substituir-se a essa preocupação. Dessa ordem são os processos de verificação que propõem aos alunos as respostas corretas ou as soluções para verificar seu desempenho. Os instrumentos concebidos para serem utilizados pelos próprios alunos de maneira a que fiquem no melhor lugar da retroação inscrevem-se claramente nessa perspectiva. As tarefas de "realce" que os alunos devem efetuar em certos exercícios de francês antes de fornecer uma resposta-produto (como, por exemplo, concordar verbos com seus sujeitos) são da mesma ordem também (Tremblay e Demers, 1988, 1990). Pode-se entender, então, que a retroação, integrada ao conjunto de tarefas ou a problemas que o sujeito deve efetuar ou resolver, possa alterar da melhor maneira possível o retrato do aluno durante o próprio desenrolar do processo de observação ou de coleta de informação. Esse modo de ver contrasta com a perspectiva docimológica e revela antes preocupações de natureza didática ou pedagógica (Scallon, 1992). E, quanto a submeter a avaliação formativa a controles de qualidade, as pesquisas realizadas no quadro de várias aplicações de retroação têm permitido apoiar essa prática de avaliação em bases muito mais racionais do que empíricas. Podemos acrescentar que, quando a retroação é dada como destinação dos atos de avaliação formativa, estes se veem, de certa maneira, livres do domínio do ensino corretivo, conforme atestam certos trabalhos sobre a questão (por exemplo, Yeany e Miller, 1983; Provencher, 1985).
Não há dúvida de que as concepções cognitivas da aprendizagem têm criado, estão criando e, provavelmente, criarão grandes desafios à prática da avaliação formativa. Até agora, tudo parece ter acontecido em torno dos roteiros ou das encenações quanto ao papel dos atores engajados numa situação de ensino e aprendizagem. Tampouco há dúvida de que o aluno exerce um papel primordial − e isso não pode ser questionado. O que ocorre quanto à estrutura do que deve ser observado? Por exemplo, o produto de um processo ou o próprio processo associado a esse procedimento? E enquanto o "quê" da avaliação formativa é relativamente fácil de determinar, determinar o "como" é muito menos fácil. É preciso reconhecer que o discurso cognitivista, apesar da forte sedução que tem exercido e continua exercendo nos meios educacionais, tem-se mantido bastante impermeável aos imperativos da avaliação formativa, a qual deve ter como ponto de partida um processo de observação. Não são muitas as definições operacionais, e jamais podemos perder de vista que qualquer observação, qualquer medição até (antes de se chegar à avaliação) deve alimentar-se de indicadores de superfície. Por exemplo, a pontualidade não é visível como tal, mas as condutas que induz nos indivíduos o são. Como outro exemplo, não se pode apreender diretamente o estado de ansiedade de um indivíduo. No máximo, podem-se enumerar comportamentos indicadores de ansiedade. Essa limitação inerente de qualquer medição − e, consequentemente, de todo processo de avaliação − representa muito provavelmente um último enclave do qual a avaliação formativa dificilmente pode ser libertada.
Vê-se, portanto, que tudo está em seu lugar para uma liberação da avaliação formativa dos principais elementos que lhe foram associados inicialmente. Pode estar ao serviço de pedagogias outras que não a pedagogia de domínio, sem por isso renegar qualquer veleidade de dar a cada aluno as melhores chances de sucesso. A prática da avaliação formativa deve orientar-se também para preocupações muito mais didáticas do que docimológicas. Enfim, falta desenvolver estratégias de coleta de observações que permitam delinear processos, caminhos tomados por alunos, a partir de indicadores "de superfície", os quais deverão ser tratados de maneira particular (ver o texto de Jean Retschitzki na presente obra e também o de Scallon [1998b], que contém um capítulo sobre a observação dos erros sistemáticos em avaliação formativa). Parece cada vez mais evidente que essa liberação corresponde estreitamente a uma preocupação dominante: a de proporcionar a cada aluno (e também aos professores) uma retroalimentação de qualidade. Resta demostrar que o recente desenvolvimento das ciências cognitivas está reforçando essa preocupação e abrindo horizontes totalmente novos para a prática da avaliação formativa.
A regulação: nenhum ovo de colombo!
Nos primeiros trabalhos mais ou menos relacionados com a prática da avalia¬ção formativa, as correções a serem prescritas para um sujeito com um rendimento inadequado não receberam nenhum rótulo particular. Na maioria das vezes, tratava-se de apontar aos alunos envolvidos exercícios adicionais de prática ou fornecer-lhes explicações que retomassem o ensino inicial. Block e Anderson (1975) descreveram um conjunto de procedimentos ditos corretivos, que se diferenciam conforme apostam na cognição ou na motivação, numa abordagem individualizada ou um trabalho de grupo, ou ainda em modalidades de apresentação do material.
Qual a situação da palavra cada vez mais citada hoje em dia ao falar-se da meta essencial da avaliação formativa: a regulação? É estranho observar que certos repertórios como o Current Index of Journals in Education (CIJE) [Índice Atualizado dos Jornais sobre a Educação] não propõem nenhuma palavra-chave a título de regulação e que as referências ao ensino corretivo (corrective teaching, remedial teaching) direcionam-se usualmente a programas inteiros de tratamento para grupos de alunos que apresentam características particulares (por exemplo, alunos subdotados, alunos deficientes, alunos com transtorno de comportamento, etc.), o que nos afasta enormemente dos limites nos quais se deve situar a avaliação formativa das aprendizagens.
Na mesma ordem de ideias, fica relativamente fácil observar que a própria prática da avaliação formativa no meio escolar tem conhecido deslizes importantes. É isso que se deduz de um relatório do Conselho Superior da Educação do Quebec, no qual a avaliação das aprendizagens no ensino fundamental é objeto de uma revisão global (1992). Seria trabalhoso descrever todos os aspectos tratados nesse documento, mas com toda a evidência, quanto à prática da avaliação formativa tal como indicada no relatório, a noção de regulação não parece estarno primeiro plano das preocupações do meio e até não parece ser muito bem-entendida.
O termo "regulação" parece emergir de certos trabalhos europeus, pois pode ser encontrado no centro de trabalhos de reflexão sobre a avaliação formativa, mais particularmente os de Allal (1978) e Cardinet (1986). A definição formal da regulação, encontrada num dicionário, a respeito de um dispositivo ou de um mecanismo é a seguinte:
fato de regular, seu funcionamento ou modo de funcionamento, notadamente para adaptá-lo às condições externas ou ao resultado a ser alcançado (CNRS, 1990). Essa definição nada acrescenta à atual compreensão do que a regulação deva ser. Os sinônimos associados são interessantes, no entanto, e deveriam ajudar a apropriar-se dessa importante noção: regular, adaptar, ajustar, controlar ou acertar.
Na minha modesta opinião, a noção de regulação merece ser claramente determinada para abordar o modo de conceber a prática da avaliação formativa em contextos pedagógicos outros que não os que a geraram. Ao ser feita a pergunta da avaliação formativa, deve-se agora olhar para uma pergunta muito mais precisa: a regulação: é o ajuste de quem ou de quê? Do aluno para que ele se ajuste a um conjunto de objetivos bem planejados? Das ações pedagógicas e didáticas para melhor adaptá-las às características pessoais dos alunos? É isso por ora o que está em jogo em qualquer esclarecimento das metas da avaliação formativa em meio escolar.
O autor deste texto quis testar essa definição de regulação tentando visualizar um episódio típico de uma pedagogia de situação inspirada em trabalhos recentes em didática da leitura (Demers e Tremblay, 1992; Tremblay e Scallon, 1994). Trata-se essencialmente de uma pedagogia que proporciona aos alunos momentos de leitura livre, momentos de leitura dirigida e projetos de leitura autônoma. Por ocasião de projetos de leitura autônoma é que se solicita aos alunos um procedimento de verificação e sua capacidade de leitura. Primeiro, eles recebem uma tarefa a realizar (por exemplo, aprender as regras de um jogo, começar uma coleção de pedras, preencher uma ficha sobre um animal, etc.). Cada projeto envolve todos os alunos que participam simultaneamente, um período de leitura autônoma (trabalho individualizado) e uma volta coletiva no percurso da leitura, o sucesso da tarefa e a experiência vivida pelos mesmos. A abordagem não é exclusiva da didática da leitura, pois a aprendizagem por problemas na medicina apresenta uma encenação semelhante: apreensão de um caso clínico em pequeno grupo na presença de um professor, procura de informações pertinentes e uso de estratégias apropriadas numa base individual, volta em grupo para analisar o diagnóstico a ser dado e discutir sobre as dificuldades de percurso. Berkson (1990) apresentou uma descrição bastante elaborada do que se apresentava inicialmente como uma abordagem pedagógica, o que se tornou um programa de formação em medicina.
Para ilustrar os diversos momentos de regulação num episódio de pedagogia de situação, a Figura 1 apresenta os ajustes possíveis desde o ponto de partida (a apreensão do projeto a ser realizado) até a volta reflexiva. O corpo dessa figura lembra que a realização da tarefa depende do domínio de vários elementos tomados do vocabulário das ciências cognitivas: conhecimentos declarativos, conhecimentos processuais, estratégias, habilidades (skills), etc. Fica entendido, porém, que não se exige o domínio desses elementos antes de se abordar um projeto, tal como na pedagogia de domínio. Contudo, não podemos negar sua importância na realização bem-sucedida da tarefa. Seguindo-se o percurso apresentado na Figura 1 é que se pode evidenciar toda a extensão do registro das regulações que se oferecem a uma pedagogia de situação, a saber:
Nos primeiros trabalhos mais ou menos relacionados com a prática da avalia¬ção formativa, as correções a serem prescritas para um sujeito com um rendimento inadequado não receberam nenhum rótulo particular. Na maioria das vezes, tratava-se de apontar aos alunos envolvidos exercícios adicionais de prática ou fornecer-lhes explicações que retomassem o ensino inicial. Block e Anderson (1975) descreveram um conjunto de procedimentos ditos corretivos, que se diferenciam conforme apostam na cognição ou na motivação, numa abordagem individualizada ou um trabalho de grupo, ou ainda em modalidades de apresentação do material.
Qual a situação da palavra cada vez mais citada hoje em dia ao falar-se da meta essencial da avaliação formativa: a regulação? É estranho observar que certos repertórios como o Current Index of Journals in Education (CIJE) [Índice Atualizado dos Jornais sobre a Educação] não propõem nenhuma palavra-chave a título de regulação e que as referências ao ensino corretivo (corrective teaching, remedial teaching) direcionam-se usualmente a programas inteiros de tratamento para grupos de alunos que apresentam características particulares (por exemplo, alunos subdotados, alunos deficientes, alunos com transtorno de comportamento, etc.), o que nos afasta enormemente dos limites nos quais se deve situar a avaliação formativa das aprendizagens.
Na mesma ordem de ideias, fica relativamente fácil observar que a própria prática da avaliação formativa no meio escolar tem conhecido deslizes importantes. É isso que se deduz de um relatório do Conselho Superior da Educação do Quebec, no qual a avaliação das aprendizagens no ensino fundamental é objeto de uma revisão global (1992). Seria trabalhoso descrever todos os aspectos tratados nesse documento, mas com toda a evidência, quanto à prática da avaliação formativa tal como indicada no relatório, a noção de regulação não parece estarno primeiro plano das preocupações do meio e até não parece ser muito bem-entendida.
O termo "regulação" parece emergir de certos trabalhos europeus, pois pode ser encontrado no centro de trabalhos de reflexão sobre a avaliação formativa, mais particularmente os de Allal (1978) e Cardinet (1986). A definição formal da regulação, encontrada num dicionário, a respeito de um dispositivo ou de um mecanismo é a seguinte:
fato de regular, seu funcionamento ou modo de funcionamento, notadamente para adaptá-lo às condições externas ou ao resultado a ser alcançado (CNRS, 1990). Essa definição nada acrescenta à atual compreensão do que a regulação deva ser. Os sinônimos associados são interessantes, no entanto, e deveriam ajudar a apropriar-se dessa importante noção: regular, adaptar, ajustar, controlar ou acertar.
Na minha modesta opinião, a noção de regulação merece ser claramente determinada para abordar o modo de conceber a prática da avaliação formativa em contextos pedagógicos outros que não os que a geraram. Ao ser feita a pergunta da avaliação formativa, deve-se agora olhar para uma pergunta muito mais precisa: a regulação: é o ajuste de quem ou de quê? Do aluno para que ele se ajuste a um conjunto de objetivos bem planejados? Das ações pedagógicas e didáticas para melhor adaptá-las às características pessoais dos alunos? É isso por ora o que está em jogo em qualquer esclarecimento das metas da avaliação formativa em meio escolar.
O autor deste texto quis testar essa definição de regulação tentando visualizar um episódio típico de uma pedagogia de situação inspirada em trabalhos recentes em didática da leitura (Demers e Tremblay, 1992; Tremblay e Scallon, 1994). Trata-se essencialmente de uma pedagogia que proporciona aos alunos momentos de leitura livre, momentos de leitura dirigida e projetos de leitura autônoma. Por ocasião de projetos de leitura autônoma é que se solicita aos alunos um procedimento de verificação e sua capacidade de leitura. Primeiro, eles recebem uma tarefa a realizar (por exemplo, aprender as regras de um jogo, começar uma coleção de pedras, preencher uma ficha sobre um animal, etc.). Cada projeto envolve todos os alunos que participam simultaneamente, um período de leitura autônoma (trabalho individualizado) e uma volta coletiva no percurso da leitura, o sucesso da tarefa e a experiência vivida pelos mesmos. A abordagem não é exclusiva da didática da leitura, pois a aprendizagem por problemas na medicina apresenta uma encenação semelhante: apreensão de um caso clínico em pequeno grupo na presença de um professor, procura de informações pertinentes e uso de estratégias apropriadas numa base individual, volta em grupo para analisar o diagnóstico a ser dado e discutir sobre as dificuldades de percurso. Berkson (1990) apresentou uma descrição bastante elaborada do que se apresentava inicialmente como uma abordagem pedagógica, o que se tornou um programa de formação em medicina.
Para ilustrar os diversos momentos de regulação num episódio de pedagogia de situação, a Figura 1 apresenta os ajustes possíveis desde o ponto de partida (a apreensão do projeto a ser realizado) até a volta reflexiva. O corpo dessa figura lembra que a realização da tarefa depende do domínio de vários elementos tomados do vocabulário das ciências cognitivas: conhecimentos declarativos, conhecimentos processuais, estratégias, habilidades (skills), etc. Fica entendido, porém, que não se exige o domínio desses elementos antes de se abordar um projeto, tal como na pedagogia de domínio. Contudo, não podemos negar sua importância na realização bem-sucedida da tarefa. Seguindo-se o percurso apresentado na Figura 1 é que se pode evidenciar toda a extensão do registro das regulações que se oferecem a uma pedagogia de situação, a saber:
·
No início: o projeto deve
corresponder ao nível de competência e às características dos alunos em geral.
A clareza das instruções, certos aspectos do projeto e as explicações dadas
devem ser submetidos a regulagens desde o início do projeto.
A
pertinência do projeto deve ser explicada para suscitar a motivação dos alunos;
as dificuldades a serem superadas devem ser percebidas de maneira tal que os
alunos experimentem uma sensação de "controle" da tarefa. Aqui
também, diversas regulagens são possíveis e até podem ser antecipadas durante o
planejamento. Essa fase é crucial, pois é a tarefa a ser realizada que fornece
aos alunos uma intenção de leitura nesse tipo de pedagogia. Além disso, o
resultado ou a meta a alcançar é que deve gerar a regulação ou a
autorregulação.
·
No caminho: conhecimentos,
habilidades, estratégias solicitadas de um projeto para outro podem estar
ausentes; no caso, o ajuste pode ser considerado em termos de consolidação pela
prática graças a exercícios estruturados com fins didáticos (feedback); por
exemplo, uma dificuldade experimentada por vários alunos desencadeará o recurso
a um procedimento instrumen¬tado para verificar de maneira formal a utilização
adequada de certas estratégias.
A leitura
e a realização da tarefa no plano individual é o cerne do projeto, o momento de
maior solicitação da autonomia de cada aluno, havendo monitoramento estreito
pelo aluno de seu caminho e questionamento em função do resultado a alcançar
(regulação feita após a autoavaliação ou atividade de metacognição).
·
Na volta: retroação sobre o percurso
seguido individualmente pelo aluno sobre a utilização de seus próprios recursos
e dos postos à sua disposição e retroação sobre o sucesso do projeto; ajustes
de longo prazo para a preparação de projetos vindouros. A encenação é uma
preparação apoiada nos intercâmbios na aula.
Os
leitores interessados encontrarão uma apresentação muito mais detalhada numa
obra recente sobre essa pedagogia da leitura (Tremblay e Scallon, 1994).
A abordagem que acaba de ser apresentada mostra com bastante clareza o duplo objeto da regulação e o papel dos atores presentes. Por um lado, vê-se que a situação pedagógica (o projeto e seus elementos) é submetida a uma regulação desde o início. Por outro lado, o procedimento do aluno com seus conhecimentos, suas habilidades e sua motivação também é tratado como um importante objeto de regulação. Por fim, seria supérfluo insistir sobre o papel do professor e dos alunos na implementação das múltiplas ações de avaliação e de regulação.
A abordagem que acaba de ser apresentada mostra com bastante clareza o duplo objeto da regulação e o papel dos atores presentes. Por um lado, vê-se que a situação pedagógica (o projeto e seus elementos) é submetida a uma regulação desde o início. Por outro lado, o procedimento do aluno com seus conhecimentos, suas habilidades e sua motivação também é tratado como um importante objeto de regulação. Por fim, seria supérfluo insistir sobre o papel do professor e dos alunos na implementação das múltiplas ações de avaliação e de regulação.
FIGURA 1 Eventos de regulação numa
pedagogia de situação
O aporte das ciências cognitivas:
quais os materiais novos para a avaliação formativa?
Situar os objetos de regulagem, de ajuste ou de regulação numa pedagogia com percursos ainda inéditos, inspirada nas mais recentes teorias da aprendizagem, é uma coisa. A outra é saber para que indícios visíveis olhar, sobre quais segmentos da informação fundamentar uma decisão, ou ainda para onde direcionar a atenção. E os professores precisam saber disso, bem como os alunos, pois, conforme o que acaba de ser dito, são eles os principais atores envolvidos na prática da avaliação formativa.
Até aqui, as aprendizagens-alvo da avaliação formativa não se diferenciaram tanto das habitualmente visadas pelas avaliação em geral: considerando resultados a alcançar expressos o mais claramente possível sob forma de objetivos de aprendizagem. Taxonomias e diversas tentativas de classificação se acumularam ao longo dos anos como testemunhava num trabalho feito por De Landsheere e De Landsheere em 1975. Porém, nenhuma dessas classificações parece ter influen¬ciado as práticas de avaliação a ponto de impor sutilezas de natureza metodológica que possa diferenciar claramente a avaliação formativa de outras funções de avaliação.
Mas qual será a situação das proposições que vêm do campo das ciências cognitivas? Trabalhos recentes que relatam problemas relativamente novos referentes à avaliação de habilidades cognitivas são muito reveladores a esse respeito. Por exemplo, além da simples medição dos conhecimentos através das técnicas de lembrança (isto é, com tarefas de restituição de respostas aprendidas), parece haver um interesse cada vez maior por sua estrutura ou por sua organização nos alunos (Royer, Cisero e Carlo, 1993). No caso dos procedimentos a serem seguidos pelos sujeitos, pode-se interessar não só pela exatidão de sua execução, como também pelo grau de automaticidade com o qual foram executadas (Anderson, 1982). E a lista dos elementos novos, inéditos até, poderia crescer ainda mais. A Figura 2 fornece uma visão dos diversos elementos tomados do campo das ciências cognitivas, com os quais é preciso lidar para ajustar as práticas de avaliação das aprendizagens. Observar-se-á que esse campo continua a descoberto e não parece haver nenhum princípio unificador que possa apontar uma direção comum para todos os futuros investimentos metodológicos.
Não cabe neste texto retomar um por um os componentes que poderiam servir de alvos para a avaliação formativa e tratá-los em profundidade. No máximo, podemos considerar de maneira puramente hipotética o que o futuro nos reserva. Para chegar a isso, é preciso esclarecer algumas questões.
A grande maioria dos textos consultados para os procedimentos de observação e avaliação (assessment) inspirados pelas ciências cognitivas dedica-se muito mais à avaliação prognóstica ou diagnóstica do que à avaliação formativa. Em complemento a essa perspectiva, as revisões de trabalho de natureza metodológica evidenciaram preferência por procedimentos utilizados para avaliar programas de intervenção ou meios de ensino (por exemplo, Benton e Kiewra, 1987; Kraiger, Ford e Salas, 1993; Royer, Cisero e Carlo, 1993). No que tange à prática da avaliação formativa, essa nuance é importante, tanto do ponto de vista metodoló¬gico quanto do ponto de vista das ações a empreender. Muitas características implicadas, como, por exemplo, a estrutura dos conhecimentos ou dos conceitos, exigem elaborados procedimentos de coleta de informações e processa¬mento dos dados, certamente não ao alcance dos professores em contato com uma turma de alunos. Assim é que se apresenta o grau de organização dos conhecimentos na estrutura cognitiva de um aluno, um dos casos mais bem-documentados nos trabalhos. Além disso, as possibilidades de regulação dos diversos fenômenos de interesse são desconhecidas em sua maioria, e os escritos sobre a avaliação diagnóstica não têm essa preocupação. Vê-se, pois, todo o problema a ser enfrentado pela formação dos professores quando se trata de propor-lhes alvos novos para a avaliação formativa, alvos emprestados de um domínio ainda emergente, como o é o das ciências cognitivas.
Situar os objetos de regulagem, de ajuste ou de regulação numa pedagogia com percursos ainda inéditos, inspirada nas mais recentes teorias da aprendizagem, é uma coisa. A outra é saber para que indícios visíveis olhar, sobre quais segmentos da informação fundamentar uma decisão, ou ainda para onde direcionar a atenção. E os professores precisam saber disso, bem como os alunos, pois, conforme o que acaba de ser dito, são eles os principais atores envolvidos na prática da avaliação formativa.
Até aqui, as aprendizagens-alvo da avaliação formativa não se diferenciaram tanto das habitualmente visadas pelas avaliação em geral: considerando resultados a alcançar expressos o mais claramente possível sob forma de objetivos de aprendizagem. Taxonomias e diversas tentativas de classificação se acumularam ao longo dos anos como testemunhava num trabalho feito por De Landsheere e De Landsheere em 1975. Porém, nenhuma dessas classificações parece ter influen¬ciado as práticas de avaliação a ponto de impor sutilezas de natureza metodológica que possa diferenciar claramente a avaliação formativa de outras funções de avaliação.
Mas qual será a situação das proposições que vêm do campo das ciências cognitivas? Trabalhos recentes que relatam problemas relativamente novos referentes à avaliação de habilidades cognitivas são muito reveladores a esse respeito. Por exemplo, além da simples medição dos conhecimentos através das técnicas de lembrança (isto é, com tarefas de restituição de respostas aprendidas), parece haver um interesse cada vez maior por sua estrutura ou por sua organização nos alunos (Royer, Cisero e Carlo, 1993). No caso dos procedimentos a serem seguidos pelos sujeitos, pode-se interessar não só pela exatidão de sua execução, como também pelo grau de automaticidade com o qual foram executadas (Anderson, 1982). E a lista dos elementos novos, inéditos até, poderia crescer ainda mais. A Figura 2 fornece uma visão dos diversos elementos tomados do campo das ciências cognitivas, com os quais é preciso lidar para ajustar as práticas de avaliação das aprendizagens. Observar-se-á que esse campo continua a descoberto e não parece haver nenhum princípio unificador que possa apontar uma direção comum para todos os futuros investimentos metodológicos.
Não cabe neste texto retomar um por um os componentes que poderiam servir de alvos para a avaliação formativa e tratá-los em profundidade. No máximo, podemos considerar de maneira puramente hipotética o que o futuro nos reserva. Para chegar a isso, é preciso esclarecer algumas questões.
A grande maioria dos textos consultados para os procedimentos de observação e avaliação (assessment) inspirados pelas ciências cognitivas dedica-se muito mais à avaliação prognóstica ou diagnóstica do que à avaliação formativa. Em complemento a essa perspectiva, as revisões de trabalho de natureza metodológica evidenciaram preferência por procedimentos utilizados para avaliar programas de intervenção ou meios de ensino (por exemplo, Benton e Kiewra, 1987; Kraiger, Ford e Salas, 1993; Royer, Cisero e Carlo, 1993). No que tange à prática da avaliação formativa, essa nuance é importante, tanto do ponto de vista metodoló¬gico quanto do ponto de vista das ações a empreender. Muitas características implicadas, como, por exemplo, a estrutura dos conhecimentos ou dos conceitos, exigem elaborados procedimentos de coleta de informações e processa¬mento dos dados, certamente não ao alcance dos professores em contato com uma turma de alunos. Assim é que se apresenta o grau de organização dos conhecimentos na estrutura cognitiva de um aluno, um dos casos mais bem-documentados nos trabalhos. Além disso, as possibilidades de regulação dos diversos fenômenos de interesse são desconhecidas em sua maioria, e os escritos sobre a avaliação diagnóstica não têm essa preocupação. Vê-se, pois, todo o problema a ser enfrentado pela formação dos professores quando se trata de propor-lhes alvos novos para a avaliação formativa, alvos emprestados de um domínio ainda emergente, como o é o das ciências cognitivas.
FIGURA 2 Visão das palavras-chave
utilizadas em algumas obras recentes relacionadas ao campo das ciências
cognitivas
A luz no fim do túnel: a metacognição
Por ora, de acordo com o estágio atual de nossos conhecimentos, não há certeza quanto às diversas habilidades e às estratégias cognitivas terem sido "pedagogi¬zadas" a um ponto tal que possam ser aprendidas ou ensinadas para serem eventualmente tratadas como simples objetos de regulação. Romainville (1993), por exemplo, pôs em dúvida, em certo sentido, a possibilidade de treinar sujeitos no uso de estratégias de estudo (p. 38ss). Será que a crítica se aplica também a um outro registro de habilidades diversas? Os textos revisados não são explícitos a esse respeito; porém, pode-se inferi-lo facilmente no caso da obra de Tardif (1992), que trata mais especialmente do ensino de estratégias. Atualmente, contudo, muitas variáveis de interesse que alimentam o discurso das ciências cognitivas são tratadas, na maioria das vezes, no quadro de pesquisas exploratórias ou na testagem da eficácia de programas de intervenção junto a clientelas com problemas ou em dificuldade. Se a importância a ser dada a essas variáveis (pode-se pensar aqui, por exemplo, no sentimento de eficácia pessoal ou na atribuição causal) fizesse com que se situassem acima de todo programa de formação, elas seriam, então, a matéria-prima da avaliação diagnóstica muito mais do que da avaliação formativa. Logo, a "educabilidade" de certas características começa a manifestar-se no horizonte de nossas preocupações. É esse o caso notadamente das mudanças feitas no sistema de atribuição causal dos indivíduos em relação a uma estrutura de feedback ou de notação mais personalizada, criterial até em certos casos (Oren, 1983; Covington e Omelich, 1984; McColskey e Leary, 1985; Butler e Nisan, 1986). Tardif (1992) relata vários estudos que teriam obtido resultados positivos para o ensino de estratégias de resolução de problemas (p. 251ss). É claro que estas são apenas pistas de reflexão, e seria preciso dedicar-lhes muito mais espaços, o que os limites deste texto não autorizam.
De todos os elementos postos em evidência nos últimos anos, um parece persistir e até resistir a todas as correntes: trata-se da autoavaliação. Embora certas pessoas tenham acreditado estar assistindo à emergência de um modismo, elas podem agora modificar sua percepção, já que se tornou um polo de atração muito documentado e seria difícil, para não dizer impossível, dar conta da abundância dos trabalhos que a trataram. No âmbito deste texto, que fique claro que a autoavaliação pode muito bem ser vista como uma modalidade de apropriação da avaliação formativa, mas também (e alguns diriam primeiro e antes de tudo) como um instrumento indispensável para qualquer empreendimento de formação. Assim é que havia de ser interpretada a concepção desenvolvida por certos pesquisadores de Aix-en-Provence, em meados dos anos 1980 − e, durante o encontro dos mais proveitosos, tomei a liberdade de utilizar o rótulo de "avaliação formadora" para apontar uma concepção da avaliação formativa muito distinta da dos pioneiros. A ideia de fazer da avalia¬ção formativa uma habilidade a ser desenvolvida nos alunos, um saber ser, foi muito bem-elaborada e defendida por Nunziati (1990).
Em sua evolução como conceito, ao longo dos anos, a autoavaliação tem-se mostrado cada vez mais como um fio condutor e um lugar de necessidade que se impõe cada vez mais à metodologia da avaliação formativa. Hoje em dia, ninguém poderia contentar-se realmente com uma abordagem global e superficial que faria da autoavaliação um simples caso de impressão geral ou um estado de espírito do qual o indivíduo tivesse maior ou menor consciência. No quadro de certas pedagogias de situação, nós a vimos ser transplantada a produções complexas, porém concretas, tais como as encontradas no campo do ensino profissional (por exemplo, no Quebec) ou ainda no francês como língua materna. O conceito de "objetivação das práticas de comunicação", tal como entendido no programa de francês (ensino fundamental e médio) do Ministério da Educação do Quebec, era e ainda é claramente dessa ordem. No entanto, para encurtar um pouco a história e a evolução das ideias, a noção de autoavaliação parece ter sido associada inicialmente com a de produção elaborada que o aluno deve realizar num contexto de relativa autonomia (Leselbaum, 1982). Como será a autoavaliação pelo aluno de seus conhecimentos sem passar por um julgamento baseado na impressão? Como será a autoavaliação de certas habilidades cognitivas que podem ser demarcadas com provas de correção objetiva? No entanto, há de se reconhecer que, durante vários anos, o discurso e a prática da autoavaliação têm permanecido bastante impermeáveis a essas diversas realidades.
A noção de "metacognição" veio dar um enfoque novo à luz de todas essas questões. Saber que se sabe fazer parece cada vez mais estar na base da autoavalia¬ção. Avaliar-se (ou autoavaliar-se) a respeito de uma tarefa, levando-se em conta vários critérios, é uma coisa; avaliar-se com o fim de elaborar gestos de natureza corretiva, com o fim de ajustar-se (e fala-se aqui em regulação feita pelo próprio indivíduo, ou seja, a autorregulação) é uma coisa totalmente diferente. Tal avaliação deve ser realista ou ainda conduzida com justiça. Assim dito, com uma certa brutalidade, a metacognição entra muito provavelmente em jogo, pois autoavaliar-se com justiça é exatamente saber que se sabe (quando se sabe) ou que não se sabe (quando não se sabe). Talvez seja assim que Allal (1993) trata do processo de regulação metacognitiva e do lugar que o mesmo deveria ocupar na avaliação formativa pelo aluno. O autor propõe um esboço que poderia revelar-se útil para articular um processo de autoavaliação: uma fase de antecipação composta por atividades de previsão para orientar a ação, uma fase de controle que consiste num processo contínuo de comparação entre um estado dado e um resultado a ser alcançado (monitoramento) e uma fase de ajuste (a regulação propriamente dita). Nesse paradigma, cabe à avaliação formativa ¬apoiar diversos níveis de autorregulação (Allal, 1993, p. 88-89).
Outro aspecto interessante há de ser destacado ao situar-se a metacognição no cerne de uma prática de avaliação formativa que faz dessa uma habilidade fundamental a ser desenvolvida nos alunos. Segundo a opinião explícita de certos pesquisadores, a metacognição parece cada vez mais suscetível a ser "educável" ou ainda "pedagogizável" além do mero fato de ela desenvolver-se com a idade. Alguns autores que têm chamado a atenção sobre esse ponto falam em "cons¬ciência metacognitiva" (Noël, 1991) ou em "tomada de consciência de seu funcio¬namento" (Romainville, 1983). Essa consciência pode ser objeto de treinamento ou de ação pedagógica − e, nessa perspectiva, Romainville insistiu muito sobre a importância do feedback ou da retroinformação (1993, p. 59-60).
Por ora, de acordo com o estágio atual de nossos conhecimentos, não há certeza quanto às diversas habilidades e às estratégias cognitivas terem sido "pedagogi¬zadas" a um ponto tal que possam ser aprendidas ou ensinadas para serem eventualmente tratadas como simples objetos de regulação. Romainville (1993), por exemplo, pôs em dúvida, em certo sentido, a possibilidade de treinar sujeitos no uso de estratégias de estudo (p. 38ss). Será que a crítica se aplica também a um outro registro de habilidades diversas? Os textos revisados não são explícitos a esse respeito; porém, pode-se inferi-lo facilmente no caso da obra de Tardif (1992), que trata mais especialmente do ensino de estratégias. Atualmente, contudo, muitas variáveis de interesse que alimentam o discurso das ciências cognitivas são tratadas, na maioria das vezes, no quadro de pesquisas exploratórias ou na testagem da eficácia de programas de intervenção junto a clientelas com problemas ou em dificuldade. Se a importância a ser dada a essas variáveis (pode-se pensar aqui, por exemplo, no sentimento de eficácia pessoal ou na atribuição causal) fizesse com que se situassem acima de todo programa de formação, elas seriam, então, a matéria-prima da avaliação diagnóstica muito mais do que da avaliação formativa. Logo, a "educabilidade" de certas características começa a manifestar-se no horizonte de nossas preocupações. É esse o caso notadamente das mudanças feitas no sistema de atribuição causal dos indivíduos em relação a uma estrutura de feedback ou de notação mais personalizada, criterial até em certos casos (Oren, 1983; Covington e Omelich, 1984; McColskey e Leary, 1985; Butler e Nisan, 1986). Tardif (1992) relata vários estudos que teriam obtido resultados positivos para o ensino de estratégias de resolução de problemas (p. 251ss). É claro que estas são apenas pistas de reflexão, e seria preciso dedicar-lhes muito mais espaços, o que os limites deste texto não autorizam.
De todos os elementos postos em evidência nos últimos anos, um parece persistir e até resistir a todas as correntes: trata-se da autoavaliação. Embora certas pessoas tenham acreditado estar assistindo à emergência de um modismo, elas podem agora modificar sua percepção, já que se tornou um polo de atração muito documentado e seria difícil, para não dizer impossível, dar conta da abundância dos trabalhos que a trataram. No âmbito deste texto, que fique claro que a autoavaliação pode muito bem ser vista como uma modalidade de apropriação da avaliação formativa, mas também (e alguns diriam primeiro e antes de tudo) como um instrumento indispensável para qualquer empreendimento de formação. Assim é que havia de ser interpretada a concepção desenvolvida por certos pesquisadores de Aix-en-Provence, em meados dos anos 1980 − e, durante o encontro dos mais proveitosos, tomei a liberdade de utilizar o rótulo de "avaliação formadora" para apontar uma concepção da avaliação formativa muito distinta da dos pioneiros. A ideia de fazer da avalia¬ção formativa uma habilidade a ser desenvolvida nos alunos, um saber ser, foi muito bem-elaborada e defendida por Nunziati (1990).
Em sua evolução como conceito, ao longo dos anos, a autoavaliação tem-se mostrado cada vez mais como um fio condutor e um lugar de necessidade que se impõe cada vez mais à metodologia da avaliação formativa. Hoje em dia, ninguém poderia contentar-se realmente com uma abordagem global e superficial que faria da autoavaliação um simples caso de impressão geral ou um estado de espírito do qual o indivíduo tivesse maior ou menor consciência. No quadro de certas pedagogias de situação, nós a vimos ser transplantada a produções complexas, porém concretas, tais como as encontradas no campo do ensino profissional (por exemplo, no Quebec) ou ainda no francês como língua materna. O conceito de "objetivação das práticas de comunicação", tal como entendido no programa de francês (ensino fundamental e médio) do Ministério da Educação do Quebec, era e ainda é claramente dessa ordem. No entanto, para encurtar um pouco a história e a evolução das ideias, a noção de autoavaliação parece ter sido associada inicialmente com a de produção elaborada que o aluno deve realizar num contexto de relativa autonomia (Leselbaum, 1982). Como será a autoavaliação pelo aluno de seus conhecimentos sem passar por um julgamento baseado na impressão? Como será a autoavaliação de certas habilidades cognitivas que podem ser demarcadas com provas de correção objetiva? No entanto, há de se reconhecer que, durante vários anos, o discurso e a prática da autoavaliação têm permanecido bastante impermeáveis a essas diversas realidades.
A noção de "metacognição" veio dar um enfoque novo à luz de todas essas questões. Saber que se sabe fazer parece cada vez mais estar na base da autoavalia¬ção. Avaliar-se (ou autoavaliar-se) a respeito de uma tarefa, levando-se em conta vários critérios, é uma coisa; avaliar-se com o fim de elaborar gestos de natureza corretiva, com o fim de ajustar-se (e fala-se aqui em regulação feita pelo próprio indivíduo, ou seja, a autorregulação) é uma coisa totalmente diferente. Tal avaliação deve ser realista ou ainda conduzida com justiça. Assim dito, com uma certa brutalidade, a metacognição entra muito provavelmente em jogo, pois autoavaliar-se com justiça é exatamente saber que se sabe (quando se sabe) ou que não se sabe (quando não se sabe). Talvez seja assim que Allal (1993) trata do processo de regulação metacognitiva e do lugar que o mesmo deveria ocupar na avaliação formativa pelo aluno. O autor propõe um esboço que poderia revelar-se útil para articular um processo de autoavaliação: uma fase de antecipação composta por atividades de previsão para orientar a ação, uma fase de controle que consiste num processo contínuo de comparação entre um estado dado e um resultado a ser alcançado (monitoramento) e uma fase de ajuste (a regulação propriamente dita). Nesse paradigma, cabe à avaliação formativa ¬apoiar diversos níveis de autorregulação (Allal, 1993, p. 88-89).
Outro aspecto interessante há de ser destacado ao situar-se a metacognição no cerne de uma prática de avaliação formativa que faz dessa uma habilidade fundamental a ser desenvolvida nos alunos. Segundo a opinião explícita de certos pesquisadores, a metacognição parece cada vez mais suscetível a ser "educável" ou ainda "pedagogizável" além do mero fato de ela desenvolver-se com a idade. Alguns autores que têm chamado a atenção sobre esse ponto falam em "cons¬ciência metacognitiva" (Noël, 1991) ou em "tomada de consciência de seu funcio¬namento" (Romainville, 1983). Essa consciência pode ser objeto de treinamento ou de ação pedagógica − e, nessa perspectiva, Romainville insistiu muito sobre a importância do feedback ou da retroinformação (1993, p. 59-60).
Para recapitular brevemente.
Ao mesmo tempo em que mantiveram o rumo sobre a regulação da aprendizagem, os especialistas do discurso sobre a avaliação formativa têm-nos proposto savoir-faires variados que refletem muito bem diversas concepções da pedagogia, bem como diversas representações do que deve ser objeto de ajustes ou regulagens. Vimos com uma certa rapidez que as primeiras versões metodológicas deviam responder aos imperativos de uma pedagogia centrada em objetivos bem-circunscritos com, além disso, a preocupação em democratizar o melhor possível o domínio desses objetivos. O advento de pedagogias mais complexas, centradas em objetos igualmente complexos (por exemplo, aprendizagem por problema ou pedagogia de situação), tem abalado uma metodologia que não soube firmar-se como tradição. Nessa dinâmica de constante mudança de definição e orientação é que o campo das ciências cognitivas tem conseguido ¬influenciar − e influenciará ainda mais − a prática da avaliação formativa. Não que esse tipo de avaliação se torne alterado conceitualmente!
Na ordem de suas apropriações é que devemos antes dirigir toda a nossa atenção. A autoavaliação, a responsabilidade de suas aprendizagens e de sua progressão pelo aluno e, no melhor dos casos, a possibilidade de o próprio aluno elaborar suas próprias ações de regulação é, sem contradição possível, a apropriação mais significativa. Embora características relativamente novas surjam do discurso das ciências cognitivas (conhecimentos declarativos, processuais, condicionais, etc.), a metacognição já se apresenta como um centro de interesse tanto para a pesquisa dos próximos anos como para a prática pedagógica. A avaliação formativa só poderá beneficiar-se com a junção entre o processamento mais aprofundado dessa consciência de seus processos cognitivos ou de suas abordagens por parte do aluno, por um lado, e os fenômenos de autoavaliação e autorregulação que já foram evidenciados há vários anos.
Ao mesmo tempo em que mantiveram o rumo sobre a regulação da aprendizagem, os especialistas do discurso sobre a avaliação formativa têm-nos proposto savoir-faires variados que refletem muito bem diversas concepções da pedagogia, bem como diversas representações do que deve ser objeto de ajustes ou regulagens. Vimos com uma certa rapidez que as primeiras versões metodológicas deviam responder aos imperativos de uma pedagogia centrada em objetivos bem-circunscritos com, além disso, a preocupação em democratizar o melhor possível o domínio desses objetivos. O advento de pedagogias mais complexas, centradas em objetos igualmente complexos (por exemplo, aprendizagem por problema ou pedagogia de situação), tem abalado uma metodologia que não soube firmar-se como tradição. Nessa dinâmica de constante mudança de definição e orientação é que o campo das ciências cognitivas tem conseguido ¬influenciar − e influenciará ainda mais − a prática da avaliação formativa. Não que esse tipo de avaliação se torne alterado conceitualmente!
Na ordem de suas apropriações é que devemos antes dirigir toda a nossa atenção. A autoavaliação, a responsabilidade de suas aprendizagens e de sua progressão pelo aluno e, no melhor dos casos, a possibilidade de o próprio aluno elaborar suas próprias ações de regulação é, sem contradição possível, a apropriação mais significativa. Embora características relativamente novas surjam do discurso das ciências cognitivas (conhecimentos declarativos, processuais, condicionais, etc.), a metacognição já se apresenta como um centro de interesse tanto para a pesquisa dos próximos anos como para a prática pedagógica. A avaliação formativa só poderá beneficiar-se com a junção entre o processamento mais aprofundado dessa consciência de seus processos cognitivos ou de suas abordagens por parte do aluno, por um lado, e os fenômenos de autoavaliação e autorregulação que já foram evidenciados há vários anos.
·
Jacques Grégoire é professor da
Faculdade de Psicologia e das Ciências da Educação da Universidade Católica de
Louvain, Bélgica.
NOTA
Este texto foi originalmente publicado no livro Avaliando as aprendizagens, de Jacques Grégoire.
Este texto foi originalmente publicado no livro Avaliando as aprendizagens, de Jacques Grégoire.
REFERÊNCIAS
·
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