BAÚ LITERÁRIO
CRÔNICAS
CORRUPÇÃO
A corrupção é o mal mais pernicioso da
infracivilização. Na supercivilização de que são exemplos os territórios
ao norte da Europa, ela é quase nula, porque os seus povos sabem corrigir as
enfermidades da democracia e vão eliminando com o progresso as causas das
doenças mentais comunitárias que atrasam a evolução da Humanidade. A legislação
é muito mais aperfeiçoada, tendo erradicado progressivamente os motivos que
levam o homem a ser lobo do homem, se não se lhe puser freio, como fazem por
lá. Abençoados sejam! Por cá não é assim para desgraça nossa.
É uma Europa onde há de tudo, como numa farmácia.
Há cidadãos que se impõem pela cidadania para que haja uma democracia saudável,
e há outros laxistas, indiferentes, preguiçosos, medrosos, passivos,
imprestáveis quando se fala em pedir-lhes que se motivem e movimentem para a
luta política.
O que fazem os cidadãos para combater a corrupção
na infracivilização? Nada. Mas na supercivilização fazem com que seja punida
exemplarmente. Exemplarmente, na Islândia e na Finlândia não foram o povo quem
pagou a crise, mas quem a causou. Abençoados povos!
A corrupção o que gera? O alheamento da vida
política, a indiferença por toda a criminalidade que anda à solta mais ou menos
protegida por leis cheias de buracos e alçapões, produzidos à medida do
interesse de pessoas pouco honestas, espertas no ludíbrio, consentindo o abuso
de privilegiados sem mérito, socorrendo-se algumas vezes de grupos de pressão
junto das autoridades, em prejuízo de quem actua dentro da lei e da ética.
A corrupção gera compadrio, gera atraso económico,
gera pobreza, gera apatia, insatisfação e revolta; gera um estilo de
comportamento social que alastra por todos os escalões do funcionalismo
público, desde as enfatuadas chefias ao mais simples subordinado que espreita
uma oportunidade de sacar mais algum dinheirito do indígena precisado de
qualquer documento ou qualquer autorização duma instituição, para esse compor
satisfatoriamente a sua vidinha tristonha ou pouco airosa. E é fácil de
ver o que está sujeito à corrupção: uma autorização para
funcionamento duma actividade comercial ou industrial, a legalização dum
benefício incomum, a compra e venda dum parecer favorável, a renovação duma
licença, o perdão duma multa, duma coima, a compra duma ilegalidade numa
empresa estatal ou mesmo semi-pública, o favorecimento num concurso público, a
angariação dum novo funcionário, com recurso à portuguesíssima cunha, o célebre
'jeitinho' à portuguesa. O seu branqueamento insere-se na ainda mal estudada
designação de 'porreirismo nacional' que vota isto tudo à lassidão e posterior
esquecimento, como se fosse uma fatalidade inelutável. Contudo, se uma vez
ou outra se requere Justiça, esta só enrola, e enrola até à
prescrição do acto ilícito ou criminoso. Porque a legislação dá azo a que
aconteça assim.
Quanto mais tempo demorar o fim da corrupção, mais
próximo estará o fim da nossa autonomia nacional. Há alguém que desperte para
esta evidência?
Nenhum comentário:
Postar um comentário