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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

VIRTUDES - AS MUITAS VEZES



VIRTUDES
Leitura
AS MUITAS VEZES


A primeira vez em que eu chorei trabalhando foi há muito tempo. Lembro-me da senhora humilde, sofrida, sentada no sofá de sua sala, aflita com o desaparecimento do filho. Ela sofria, nitidamente. Sua voz era como um eco de socorro e eu me comovi.
Dias depois, talvez menos, o corpo do desaparecido era encontrado dependurado numa árvore. Ele tinha se enforcado.
Ah, mas era o começo da minha carreira; bobinha ainda! "Você tem que ser profissional, imune às emoções. Não se envolva!"
Ok.
A mais recente ocasião em que chorei trabalhando foi há alguns meses. O senhor morador de rua contava sua história e num determinado ponto, sua voz embargou. Disse que pedia a Deus para dar-lhe forças para sair daquela situação. E seus olhos verdes encheram-se de lágrimas. Assim como os meus. "Você vai chorar também?", questionou-me.
Não havia mais o que fazer. As lágrimas já tinham escorrido mesmo, denunciando que eu não sabia controlar minhas emoções e que eu nunca serei apenas uma patética escutadora de histórias. Por quê?
Porque ainda consigo reconhecer sentimentos.
E a dor, quando a gente a reconhece no outro, é muito difícil ignorá-la. Este sofrimento nos irmana, nos humaniza. Demonstra que existem corações por dentro destas carcaças arranhadas. Corações que se solidarizam e se comprazem.
Porque não dá para ser "boneco de posto". Fazer figuração na vida real como se houvesse sempre a obrigação da frieza, tendo nas mãos a calculadora implacável do "o que eu vou ganhar com isto?".
Sem mais cobranças de "não chore", "não se comova", "cada um com seus problemas". Sim, cada um com seus problemas, mas, embora não possamos fazer nada PELO outro, é possível mostrar um caminho, fazer algo PARA. É possível estender a mão, abraçar. E talvez isto valha muito mais a pena do que qualquer outra coisa

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