VIRTUDES
LEITURA
VOCÊ ESTÁ DEMITIDO
VOCÊ ESTÁ DEMITIDO
- Você está demitido.
- Virge santíssima, não brinca assim.
- É sério. Você está demitido.
- Nossa! Mas de uma hora pra outra?
- Sabe como é, a empresa vai passar por uma reestruturação.
- Puxa, eu trabalho há 27 anos aqui, nunca trabalhei em outro lugar.
- Pois é. Chamei o senhor aqui para negociar.
- Negociar o quê?
- Os termos da demissão em comum acordo.
- Como assim? Não tem nada de comum acordo. Estou sendo demitido. E sem justa causa.
- A causa é justa, na verdade. Entenda. É a crise. Mas de fato não podemos caracterizar como justa causa. Uma pena.
- Então não tem o que negociar.
- Sabe o que é? A gente quer contar com o senhor no futuro. Como colaborador, entende?
- Não. Não entendo.
- Seus serviços. O senhor desempenha uma função essencial para os nossos negócios, e não podemos deixá-lo na mão. Acredito que possamos entrar num acordo para terceirizar você assim que a lei permitir.
- E quando vai ser isso?
- Daqui a 18 meses. É o que está na nova lei. Quarentena para migrar de contrato por tempo indeterminado para contrato intermitente.
- Dezoito meses? E como eu vivo até lá?
- Veja bem, tenho certeza que o senhor vai saber se virar. Não faltarão oportunidades.
- Aos 46 anos? Sei...
- Ah, não fala assim. Você está no auge. Não é toda companhia que pode contar com a sua experiência. E você ainda pode pegar um trabalho por produção...
- Produção?
- É, ora. A empresa paga você pelo que você produzir. E você se vira com o resto. Não precisa bater ponto nem nada. Muito mais fácil assim, sem transporte, sem alimentação, sem estação de trabalho... Por até 17 meses.
- Dezessete meses?
- Isso. É a lei. Para não incidirem impostos e para você não sacar o seguro desemprego. Mas isso é outro assunto. Não se preocupe com isso agora.
- Caramba. Estou chocado. Minhas mãos estão até tremendo. Tem o financiamento da casa, a faculdade da Ana, o colégio do Edu.
- Toma um gole d'água. Melhorou?
- Bom, pelo menos vou poder sacar o FGTS até me acertar.
- 80%.
- Como?
- 80% do FGTS. É o que estabelece a nova lei. Se fizermos um acordo, você poderá retirar 80% do FGTS.
- Meu Deus... Ainda bem que tem 40% de multa rescisória.
- 20%.
- Como?
- 20% de multa. É o que diz a nova lei. Se fizermos um acordo, a empresa paga 20% da multa. Sobre 80% do fundo, é claro. É justo. É a metade entre zero e 40%. Todos ganham.
- Todos ganham? Como assim, todos ganham? E se eu não quiser fazer acordo nenhum?
- Aí será mesmo uma pena, porque nunca mais vamos contratar você como PJ.
- Mas esse acordo, vou consultar o sindicato.
- Não adianta.
- Como?
- Não adianta. É o que determina a nova lei. Os acordos individuais entre patrão e empregado valem mais do que as convenções e os acordos coletivos.
- Rapaz... mas a legislação...
- Esquece.
- Como?
- Esquece a legislação. Está na lei. Os acordos entre patrão e empregado valem mais do que a legislação.
- Não é possível! Não foi para isso que eu fui a dezenas de assembléias, não foi para isso que eu me sindicalizei, nem é pra isso que pagamos a contribuição compulsória.
- Acabou.
- O quê?
- A contribuição sindical obrigatória. Não é incrível? Finalmente. Bando de sanguessugas. Repara como essa reforma é boa. Você não vai mais precisar pagar a contribuição sindical. Taí um Congresso Nacional que defende o trabalhador.
- Virge santíssima, não brinca assim.
- É sério. Você está demitido.
- Nossa! Mas de uma hora pra outra?
- Sabe como é, a empresa vai passar por uma reestruturação.
- Puxa, eu trabalho há 27 anos aqui, nunca trabalhei em outro lugar.
- Pois é. Chamei o senhor aqui para negociar.
- Negociar o quê?
- Os termos da demissão em comum acordo.
- Como assim? Não tem nada de comum acordo. Estou sendo demitido. E sem justa causa.
- A causa é justa, na verdade. Entenda. É a crise. Mas de fato não podemos caracterizar como justa causa. Uma pena.
- Então não tem o que negociar.
- Sabe o que é? A gente quer contar com o senhor no futuro. Como colaborador, entende?
- Não. Não entendo.
- Seus serviços. O senhor desempenha uma função essencial para os nossos negócios, e não podemos deixá-lo na mão. Acredito que possamos entrar num acordo para terceirizar você assim que a lei permitir.
- E quando vai ser isso?
- Daqui a 18 meses. É o que está na nova lei. Quarentena para migrar de contrato por tempo indeterminado para contrato intermitente.
- Dezoito meses? E como eu vivo até lá?
- Veja bem, tenho certeza que o senhor vai saber se virar. Não faltarão oportunidades.
- Aos 46 anos? Sei...
- Ah, não fala assim. Você está no auge. Não é toda companhia que pode contar com a sua experiência. E você ainda pode pegar um trabalho por produção...
- Produção?
- É, ora. A empresa paga você pelo que você produzir. E você se vira com o resto. Não precisa bater ponto nem nada. Muito mais fácil assim, sem transporte, sem alimentação, sem estação de trabalho... Por até 17 meses.
- Dezessete meses?
- Isso. É a lei. Para não incidirem impostos e para você não sacar o seguro desemprego. Mas isso é outro assunto. Não se preocupe com isso agora.
- Caramba. Estou chocado. Minhas mãos estão até tremendo. Tem o financiamento da casa, a faculdade da Ana, o colégio do Edu.
- Toma um gole d'água. Melhorou?
- Bom, pelo menos vou poder sacar o FGTS até me acertar.
- 80%.
- Como?
- 80% do FGTS. É o que estabelece a nova lei. Se fizermos um acordo, você poderá retirar 80% do FGTS.
- Meu Deus... Ainda bem que tem 40% de multa rescisória.
- 20%.
- Como?
- 20% de multa. É o que diz a nova lei. Se fizermos um acordo, a empresa paga 20% da multa. Sobre 80% do fundo, é claro. É justo. É a metade entre zero e 40%. Todos ganham.
- Todos ganham? Como assim, todos ganham? E se eu não quiser fazer acordo nenhum?
- Aí será mesmo uma pena, porque nunca mais vamos contratar você como PJ.
- Mas esse acordo, vou consultar o sindicato.
- Não adianta.
- Como?
- Não adianta. É o que determina a nova lei. Os acordos individuais entre patrão e empregado valem mais do que as convenções e os acordos coletivos.
- Rapaz... mas a legislação...
- Esquece.
- Como?
- Esquece a legislação. Está na lei. Os acordos entre patrão e empregado valem mais do que a legislação.
- Não é possível! Não foi para isso que eu fui a dezenas de assembléias, não foi para isso que eu me sindicalizei, nem é pra isso que pagamos a contribuição compulsória.
- Acabou.
- O quê?
- A contribuição sindical obrigatória. Não é incrível? Finalmente. Bando de sanguessugas. Repara como essa reforma é boa. Você não vai mais precisar pagar a contribuição sindical. Taí um Congresso Nacional que defende o trabalhador.
(Texto de Camilo Vannuchi)